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HISTÓRIAS E LENDAS DE CUBATÃO
Onde a altitude é que define o endereço

Com a construção das rodovias Anchieta e Imigrantes, e de várias plantas industriais, grande contingente de trabalhadores migrou para Cubatão e, com o término das obras, ficou desempregado e muitas vezes sem ter onde morar, para onde ir. Em muitos casos, esses trabalhadores se apossaram dos próprios alojamentos abandonados usados nas obras, ou construíram barracos em locais de invasão, nas encostas da Serra do Mar.

São os chamados bairros-cota, em que a altura em relação ao nível do mar é que define o endereço: cota 95, 95 metros de altitude, cota 400 situando-se a 400 metros de altura na encosta da serra.

Por serem áreas de invasão, em locais de preservação ambiental e sujeitas a deslizamentos da frágil camada de solo das montanhas, criaram-se os impasses: não podem ser oficializadas pelo Poder Público, mas vão se institucionalizando através de melhorias diversas, sempre insuficientes. Esses problemas foram abordados pelo jornal O Estado de São Paulo, em 5 de outubro de 2002, no caderno Cidades:


Aumento do número de habitantes nas encostas do parque estadual é tão grande que em alguns pontos a estrada divide os bairros e os motoristas parecem trafegar por área urbana: descaso
Foto: José Luís da Conceição/AE, publicada com a matéria

O QUE É UM BAIRRO-COTA

A expressão refere-se à altura das áreas em relação à Serra do Mar. O Cota 95, por exemplo, está a 95 metros de altura em relação ao nível do mar. O Cota 200 está a 200 e assim por diante. Em um primeiro momento, os cota eram os locais onde ficavam alojamentos dos trabalhadores que construíram a Via Anchieta, nos anos 40. Depois, acabaram sendo ocupados.

 

BAIRROS-COTA DE CUBATÃO
A Serra do Mar que o crime vai ocupando

Parte dos bairros-cota vive com medo dos traficantes, como acontece nos morros do Rio; até comício de candidata teve de ser cancelado

Moacir Assunção e José Luís da Conceição

O aumento explosivo da população dos bairros-cota de Cubatão, no Parque Estadual da Serra do Mar, e a qualidade de vida precária dessas pessoas transformou os locais em focos de criminalidade nos últimos anos. Tanto que agora o maior temor dos moradores é que áreas como o Cota 200 e o bairro Água Fria virem uma espécie de miniatura do Complexo do Alemão, no Rio, sob domínio do tráfico.

No Água Fria, por exemplo, morava José Edson da Silva, acusado pelos comparsas de ordenar ao menor L.S.N. que matasse o prefeito de Santo André Celso Daniel, em janeiro. Já no Cota 200, os moradores não se identificam, com medo de represálias dos criminosos. Mas não deixam de fazer advertências aos forasteiros que andam pelo local.

"Não é seguro subir até o Jardim Europa", dizem. Eles se referem à área mais alta do bairro, onde os traficantes dão as ordens. "É bom sempre ir acompanhado", afirmou um morador dias atrás.

Os avisos não são à toa. Há duas semanas, homens armados impuseram o cancelamento do comício que uma candidata a deputado estadual faria no bairro. Os organizadores do evento ficaram sob a mira de revólveres.

Também não é raro os bandidos do Jardim Europa atacarem caminhões de entrega. Vários veículos com gás e móveis já foram roubados. E, como nas favelas cariocas, as ruas estreitas e irregulares dos bairros-cota dificultam o acesso de carros de polícia e de ambulâncias.

Segundo relatório recente da Ouvidoria da Polícia, a Baixada Santista é um dos locais mais violentos do Estado, principalmente em relação ao tráfico de drogas.

 

Região tem cerca de 25 mil moradores, muitos estivadores e petroleiros

 

Lampião - E a violência não é o único problema que afeta os moradores. Depois de passar dez anos de sua vida combatendo os cangaceiros Lampião e Corisco na Bahia, o ex-policial militar Oresto Barbosa de Souza, o Marancó, de 84 anos, enfrenta agora as dificuldades de morar no Cota 400. No local, cerca de 2.500 pessoas sobrevivem sem esgoto e com poucas alternativas de transporte coletivo.

O abastecimento de água dos bairros Cota 200 e 400 é garantido por canos pretos, alguns furados, ligados diretamente a fontes e cachoeiras dentro da mata. Eles correm ao lado do esgoto e as águas se misturam em alguns pontos das vielas do bairro.

Casas de alvenaria, como a de Marancó, convivem com barracos levantados há pouco tempo, aos quais só é possível chegar por escadarias rústicas feitas na terra, em meio a sacos de lixo.

"Passo um frio danado nesta serra gelada, mas gosto do Cota 400, apesar da dificuldade de ir à cidade", afirma Marancó, que lutou em 1940, na batalha em que foi morto Cristino Gomes da Silva Cleto, o Corisco. Três anos depois, estava em São Paulo, trabalhando como funcionário do Departamento Estadual de Estradas de Rodagem (DER) na construção da Via Anchieta. Já ficou morando por lá.

Morador do 200, onde vivem perto de 6 mil pessoas, Bartolomeu de Jesus Costa aponta a falta de rede de esgotos e de posto de saúde, além da inexistência de quadra poliesportiva e laboratório na Escola Estadual Professora Maria Helena, como os principais problemas do bairro. "Na verdade, somos carentes de tudo".

 

"Passo um frio danado, mas gosto"

 

Superpopulação – Os bairros-cota 200, 400 e 500, chamados assim por causa de sua altura em relação ao nível do mar, e o bairro da Água Fria, ficam dentro do Parque Estadual da Serra do Mar, reserva de mata atlântica do Estado. Atualmente, abrigam cerca de 25 mil pessoas, empurradas para os bairros-cota após a crise do pólo petroquímico e do Porto de Santos, dois dos maiores empregadores da região.

Só para se ter uma idéia do boom na área, o Cota 400, que em 1976 tinha 45 barracos, hoje possui 204 moradias. Nelas vivem muitos estivadores e petroleiros desempregados. A falta de trabalho é um problema geral na cidade. São 14 mil desempregados. Seis mil deles só dependem da caridade para viver.


O ex-PM Marancó, que combateu Lampião, mora na Cota-400 desde 1943
Foto: José Luís da Conceição/AE, publicada com a matéria

Ação na Justiça acusa governos de omissão

Promotoria responsabiliza prefeitura e Estado por destruição ambiental

As invasões nos bairros-cota estão fora do controle efetivo da prefeitura e do Estado. A ocupação desordenada desses trechos do Parque Estadual da Serra do Mar preocupa ambientalistas e integrantes do Ministério Público Estadual (MPE), que temem que o excesso de moradias cause mais danos às reservas de mata atlântica.

Há três anos, a Promotoria de Meio-Ambiente de Cubatão entrou com uma ação civil, acusando de omissão o Estado e a prefeitura de Cubatão. Segundo a promotora Liliane Garcia Ferreira, formou-se no município uma indústria das invasões, com participação de candidatos a vereador e prefeito.

De acordo com ela, em época de eleições, os políticos estimulam a ocupação irregular com a doação de material de construção em troca de votos. Os índices sociais de Cubatão só pioram esse quadro. Do total de 107 mil moradores da cidade, 61% vivem em favelas.

Além de ameaçar o equilíbrio ecológico, a ocupação irregular, iniciada na década de 40 com o fim da construção da Anchieta, representa sério risco de contaminação a mananciais como o Rio Pilões, que abastece 80% da Baixada Santista.

Os cerca de 1.200 moradores do bairro Água Fria estão ao lado do rio, que corre cheio de detritos, e a 8 quilômetros da estação de captação da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).

 

São 3 guardas para 139 mil hectares

 

A médio prazo, pelo menos, as perspectivas não são favoráveis. A responsável pelo núcleo Cubatão do Parque Estadual da Serra do Mar, Sueli Lorejan, admite a dificuldade de evitar invasões. "Temos apenas três guardas para proteger a área de 139 mil hectares do parque. Os moradores erguem em 15 minutos um barraco e não temos condições de coibir isso".

O engenheiro Pedro de Sá Filho, da Secretaria de Obras e Meio-Ambiente da prefeitura, também reconhece a ineficiência da fiscalização. "As invasões aumentaram e há casos de que um mesmo barraco passou a abrigar duas famílias".

Na ação, a promotoria ainda pede que a Justiça obrigue o poder público a levar os moradores para conjuntos habitacionais. Mas quem vive nos bairros-cota não acredita muito nessa hipótese.

Líder comunitário do Cota 400, Carlos de Souza Filho não acha que a ação ajude a resolver a situação. "Esse boato sempre surge nas eleições, mas quem veio para cá foi gente que realmente precisava viver e não tinha alternativa".

Também morador antigo do bairro, Valdemar da Silveira disse que chegou a reclamar com os novos invasores. "Eles dizem que como estou morando eles também podem e tenho muito medo de levar tiro".

Para o ambientalista Condesmar Fernandes de Oliveira, integrante do Movimento em Defesa da Vida, a situação dos bairros-cota reflete o descaso de autoridades e empresários. "Recrutados em Minas e no Paraná, os operários vêm para cá trabalhar nas rodovias. Quando acaba o trabalho, são abandonados à própria sorte. Sem saída, eles invadem". (M.A.)


Waldemar Silveira, morador do Cota 400: "Medo de levar um tiro"
Foto: José Luís da Conceição/AE, publicada com a matéria

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