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ROTA DE OURO E PRATA
Navios: o Potaro

1904-1915

As origens da empresa construtora de navios Harland & Wolff, de Belfast, remontam a 1850, quando a Belfast Iron Works foi fundada por Thomas Barnes. Pouco tempo após a fundação, esta empresa foi absorvida por uma concorrente de maior porte, a Belfast Iron Company, que, entre outras iniciativas, criou um pequeno estaleiro para a fabricação de navios com casco de ferro.

Em 1859, este estaleiro, que já havia fabricado, desde a criação, cinco grandes veleiros, dois vapores e um rebocador, foi adquirido por Edward Harland, até então gerente da empresa.

Acordo - Dois anos mais tarde, Harland associou-se, num acordo válido por oito anos, com Gustav Wilhelm Wolff, originário de Hamburgo e que havia sido, durante os últimos quatro anos, seu assistente na condução dos negócios do estaleiro. O acordo assinado entre Harland e Wolff constituiu-se, assim, na base jurídica na qual se apoiariam os dois homens para desenvolver a empresa de construção naval que décadas mais tarde seria uma das maiores do mundo.

Em agosto de 1874, foram admitidos outros três sócios na empresa: William James Pirrie e os irmãos Walter e Alexander Wilson. Estes três novos sócios trouxeram consigo um total de 25 mil libras esterlinas, sob forma de aumento de capital.

Prosperidade - A partir daquele momento, os negócios só prosperaram, sobretudo graças ao espírito inovador e empreendedor de W.J. Pirrie, verdadeiro motor na expansão do estaleiro. Por volta do ano de 1884, Pirrie já havia se tornado acionista majoritário e alguns anos mais tarde reinava sem contestação na direção do Harland e Wolff. Em fins do século XIX, a Grã-Bretanha era a nação mais potente na face da Terra, possuidora de um vasto império colonial, que se estendia de sol a sol. Era também, já há muitos anos, a incontestável líder da construção naval, seus estaleiros sendo responsáveis por mais de 80% da produção mundial de navios.

E, dentro deste universo marítimo, W.J. Pirrie havia se tornado uma figura de proeminência, freqüentando todos os que contavam no cenário de shipping (navegação), personagens como Albert Ballin, Bruce Ismary, J.P. Morgan, sir Donald Currie, Arthur Bibby, Christopher Furness, John Ellerman e tantos outros.

O Potaro, o Pardo e o Parana eram navios gêmeos mistos, de transporte de cargas e passageiros

Foto: reprodução, publicada com a matéria

Desconto - Quando os irmãos Phillips, Owen e John, tomaram as rédeas da então decadente Royal Mail Steam Packet (RMSP) no início de 1903, a direção anterior da armadora já havia assinado contrato com o Harland & Wolff para a construção de dois navios mistos - de cargas e passageiros - de porte médio (e que receberiam, no lançamento, os nomes de Pardo e Potaro) com um substancial desconto de 13% no preço de base, tal transação ocorrendo por iniciativa de Pirrie.

Owen e John Phillips, tais como tantos outros, foram atraídos pela forte personalidade e habilidade de negócios de William Pirrie, nascendo, a partir de 1904, uma amizade que ligaria estes três homens por muito tempo e que faria aparecer, na Rota de Ouro e Prata, sob as cores da Royal Mail, tantos transatlânticos construídos pelo Harland & Wolff.

O par Pardo e Potaro foi complementado por um terceiro vapor de características semelhantes ordenado à Workman Clark & Co. (o Parana), todos os três destinados a servir a linha Brasil e o Prata, dispondo de câmaras de refrigeração e de congelamento para o transporte de carne.

Trio - Contemporaneamente, a Royal Mail havia ordenado ao Estaleiro Armstrong Whitword & Co., outros três cargueiros destinados à linha das Índias Ocidentais (Conway, Caroni e Catalina).

O aparecimento deste sexteto de cargueiros mistos marcou o início de uma nova era na história da Royal Mail, pois que a armadora passava a dar mais importância à carga, como geradora de recursos financeiros, do que ao tráfego de passageiros.

Além do mais, os seis possuíam, em seu desenho e concepção, elementos técnicos inovadores (como câmaras de refrigeração que podiam ser transformadas em espaço para dormitório), que lhes davam confiabilidade e regularidade operacional.

Além do mais, o sexteto de vapores vinha substituir tonelagem bem antiga, pois já haviam transcorrido bem oito anos desde a construção dos últimos navios para a Royal Mail (o trio La Plata, Minho e Ebro, de 1896) e a armadora possuía, no começo do século, ainda algumas velhas relíquias, como o Avon, de 1880, o Don, de 1872, e o Elbe, de 1869.

Viagens inaugurais - O primeiro da série P a surgir foi o Parana, lançado em 28 de abril de 1904, em Belfast. Foi seguido em junho e setembro, pelo Pardo e Potaro. As viagens inaugurais para o Brasil e o Prata aconteceram, pela ordem dos navios citados, em junho, outubro e dezembro do mesmo ano.

Embora tivesse sido concebido como de cargueiros, este trio de vapores podia ser considerado do tipo misto, já que, como dito anteriormente, era equipado com camas de ferro desmontáveis, nos porões destinados à carga refrigerada.

O estratagema era simples: nas viagens para a América do Sul, as camas eram montadas nos porões vazios, que se transformavam, assim, em acomodações espartanas para o transporte de emigrantes em steerage. Na viagem de retorno para a Inglaterra, as camas eram retiradas e os porões se enchiam de carne argentina ou uruguaia. Os emigrantes eram embarcados em Bilbao ou Vigo, Leixões ou Lisboa, quase todos de origem espanhola ou portuguesa, destinados a Santos ou Buenos Aires.

Com esta utilização dupla, este trio de navios tornou-se altamente rentável para a Royal Mail, pois tanto o tráfego de emigrantes como o das carnes platinas esteve em constante aumento até a eclosão da Primeira Guerra Mundial, em 1914.

Sem problemas - O Parana, o Pardo e o Potaro revelaram-se navios de boa qualidade, navegando por longo tempo na Rota de Ouro e Prata, sempre por conta da Royal Mail e sem nunca terem apresentado problemas. Os dois primeiros tiveram utilidade por 30 anos, sendo ambos vendidos para demolição em 1934.

O Potaro não conseguiu alcançar tão respeitável idade, vitimado por circunstâncias de guerra. Havia zarpado com lastro de Liverpool no dia de Natal de 1914, com destino ao Rio da Prata, sob o comando do capitão Matthews Bennet, mas a viagem não era das rotineiras. A Europa estava em conflito declarado desde agosto e no Atlântico Norte e Atlântico Sul cruzavam alguns navios corsários de bandeira alemã, atacando e capturando navios mercantes aliados.

Cerração - Num domingo de manhã, 10 de janeiro, encontrando-se em navegação nas proximidades das ilhas de Cabo Verde, o Potaro encontrou um vasto banco de neblina, que reduzira a visibilidade para poucas dezenas de metros. Por volta de meio-dia, no nevoeiro reinante, surgiu um outro navio não identificado, que avançava a toda força em direção da posição do Potaro, onde o capitão Bennet, suspeitando da situação, ordenou uma virada de bordo de 180 graus.

Esta mudança de rumo foi, no entanto, acompanhada pelo vapor desconhecido e, a partir daquele momento, o comandante inglês havia dissipado as suas dúvidas: estava com um corsário alemão no seu encalço, viajando ao dobro da velocidade do Potaro.

Pedidos de socorro - Bennet ordenou então o envio de sucessivas mensagens SOS, que ficaram sem resposta. Às 13h30, o navio que perseguia o Potaro disparou uma salva de advertência, enviando, ao mesmo tempo, sinal, por bandeira, de que ordenava a parada das máquinas. O Potaro encontrava-se então nas coordenadas 5º48' Norte de latitude e 25º58' Oeste de longitude e a cerca de 1,5 mil metros do intruso.

Bennet identificou o navio como sendo o transatlântico alemão Kronprinz Wilhelm, porém o que ele desconhecia era o fato de que este grande navio havia sido transformado em cruzador auxiliar armado com dois canhões pesados e que, desde setembro de 1914, já havia sido capturado e afundado outros sete navios aliados, sempre sob o comando do capitão-de-mar-e-guerra Thierfelder.

 

O navio foi implodido a 150 milhas (280 quilômetros)

a Sudeste da Ilha Trindade

 

Presa de guerra - De bordo do Kronprinz Wilhelm, foi enviado um bote com 15 homens armados, sob o comando de tenente Fix. Este, ao encontrar-se com Bennet, declarou o Potaro presa de guerra da Marinha Imperial da Alemanha.

Em vista da qualidade do navio e do fato de que a bordo havia 180 toneladas de carvão, Thierfelder decidiu não afundar o Potaro e, dando-lhe nova tripulação alemã sob o comando do tenente Muller, ordenou que este acompanhasse o seu navio.

Nas três semanas que se seguiram, o Potaro foi esvaziado de tudo o que podia ser de utilidade a bordo do Kronprinz Wilhelm, carvão em primeiro lugar, apetrechos e instrumentos em seguida. Em 6 de fevereiro, tudo tendo sido saqueado e o navio sem mais utilidade para o corsário, o Potaro foi implodido numa posição a cerca de 150 milhas a sudeste da Ilha da Trindade, no Atlântico Sul.

Potaro:

Outros nomes: nenhum
Bandeira: britânica
Armador: Royal Mail Steam Packet Company
País construtor: Grã-Bretanha
Estaleiro construtor: Harland & Wolff

Porto de construção: Belfast

Viagem inaugural: 1904

Comprimento: 114 m

Boca (largura): 14 m

Arqueação  bruta: 4.378 t

Velocidade: 12 nós (22 km/h)

Passageiros: 360, de classe steerage (emigrante)

Artigo publicado no jornal A Tribuna de Santos em 9/6/1996