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BAIXADA SANTISTA - LIVROS - Docas de Santos
Capítulo 5

Clique aqui para ir ao índicePublicada em 1936 pela Typographia do Jornal do Commercio - Rodrigues & C., do Rio de Janeiro - mesma cidade onde tinha sede a então poderosa Companhia Docas de Santos (CDS), que construiu o porto de Santos e empresta seu nome ao título, esta obra de Helio Lobo, em 700 páginas, tem como título Docas de Santos - Suas Origens, Lutas e Realizações.

O exemplar pertencente à Biblioteca Pública Alberto Sousa, de Santos/SP, pertenceu ao jornalista Francisco Azevedo (criador da coluna Porto & Mar do jornal santista A Tribuna), e foi cedido a Novo Milênio para digitalização, em maio de 2010, através da bibliotecária Bettina Maura Nogueira de Sá, sendo em seguida transferido para o acervo da Fundação Arquivo e Memória de Santos. Assim, Novo Milênio apresenta nestas páginas a primeira edição digital integral da obra (ortografia atualizada nesta transcrição) - páginas 30 a 35:

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Docas de Santos

Suas origens, lutas e realizações

Helio Lobo

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PRIMEIRA PARTE (1886-1895)

Capítulo V

Construir, saneando

Escrevera o barão de Lucena, ministro da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, no seu relatório de 1891:

O cais já tem prontos quase cem metros e acham-se em construção 27 metros de muralha e 48 de maciço concretos, esperando os concessionários inaugurar dentro de poucos meses o trecho que vai do Arsenal à Alfândega.

Com efeito, aos 2 de fevereiro de 1892, entregou a empresa ao tráfego o primeiro trecho, na extensão de 260 metros. Aos 2 de setembro seguinte estava pronto o primeiro armazém. O primeiro navio a atracar foi o Nasmith, da companhia Lamport & Holt, de Liverpool. No dia 27 de junho seguinte fazia a empresa a ligação de seus trilhos com a São Paulo Railway, iniciando-se o serviço de tráfego no dia imediato [35]; foram então entregues ao tráfego mais 400 metros de cais.

Exultou a Associação Comercial da cidade, que assim assinalou, em 1893, o acontecimento:

Pelo relevante serviço que já está prestando o trecho em tráfego (260 metros), podemos ajuizar as vantagens, as facilidades e os lucros que o nosso comércio auferirá, quando todo ele estiver construído, e quando tal se der, poderemos nos orgulhar de possuirmos o melhor porto da América do Sul e um dos mais notáveis, senão igual aos mais afamados do mundo. Também poucas vezes tem-se visto entre nós executar-se com tanta perfeição e probidade uma obra de tão elevado valor; é esta a opinião dos competentes.

Registrou também o Relatório da companhia, em 1894:

Quanto ao tráfego que, a instâncias do comércio de Santos, iniciamos a 2 de fevereiro de 1892, tem sido executado com a possível regularidade de um serviço provisório.

As vantagens que dele têm fruído, tanto o Governo Federal como o mesmo comércio, se hão tornado bem patentes no aumento das rendas arrecadadas, de então para cá, na Alfândega de Santos, e na diminuição das despesas a que estava sujeito o comércio, tais como os enormes fretes marítimos com que eram sobrecarregadas as mercadorias destinadas àquele porto, o custo exagerado do estivamento dos navios e dos transportes, por meio de carroças etc.

Acresce ainda a eliminação das onerosas estadias, de um ano e mais, que ali tinham os navios, por falta de meios de descarga e de armazéns, para depósito das mercadorias, e a cessação dos extravios destas, que eram muito comuns em Santos.

Esta companhia não se tem poupado a despesas e sacrifícios de qualquer ordem, para colocar esse serviço em condições de poder corresponder ao que dele espera o Governo Federal e o comércio, tendo em via de execução as obras que ao mesmo Governo pareceram necessárias, e os melhoramentos que a prática há demonstrado conveniência em adotar.

A inauguração, feita então em caráter provisório, pois mal se podia abrir o cais ao comércio sempre crescente, explicou-se, além da ansiedade pública, pelas condições em que se achava o porto. Deu a necessária permissão o ministro da Fazenda de então, Rodrigues Alves, o qual, no seu Relatorio de 1892, assim a justificou:

Solicitei do Ministério da Agricultura que, com urgência, me auxiliasse no empenho de libertar o porto de Santos das grandes dificuldades de que está cercado, com graves prejuízos do comércio e da fazenda; e mandei que fosse entregue ao tráfego a porção de cais já feita.

Deste modo proporcionava pessoal para acudir não só ao serviço da descarga e dos armazéns, como ao expediente dos despachos; abreviava a saída das mercadorias de mais fácil verificação, aumentava o espaço para abrigo e separação dos gêneros e provocava diligências para que fosse mais expedita a condução das mercadorias saídas da Alfândega.

Enquanto assim providenciava, diversas representações foram dirigidas a este Ministério, algumas até por intermédio de legações aqui acreditadas, às quais respondi fazendo referência às resoluções tomadas.

Eram, com efeito, urgentemente exigidas pelas circunstâncias, a fim de que não continuassem a ser prejudicados o comércio, a navegação e o consumo, como estavam sendo com a demora excessiva das embarcações no porto por falta de descarga, e com aglomeração das mercadorias descarregadas, por falta de despacho, que ao mesmo tempo as punha em risco de deterioração e determinava escassez no mercado.

O espetáculo de Santos, abarrotado de mercadorias, com inúmeros navios descarregando nos pontões ou à espera de atracação, era de impressionar. Aquele primeiro trecho de doca, apenas inaugurado, constituía boa promessa. Poderia acaso divergir-se politicamente quanto à conveniência da federação no Brasil, mas o certo era que economicamente com ela adquiriam alguns Estados, sobretudo os mais ricos, a necessária autonomia, dando largas à exportação para os outros e para o exterior.

Quanto à importação, operava-se sob o câmbio já desvalorizado, mas sem a parte ouro do imposto aduaneiro. Santos ia, assim, galgando no nosso comércio interno e externo, posição cada vez mais predominante [36]. A consequência foi uma abundância de artigos estrangeiros. Tais a desordem, a grita dos reclamantes, os interesses feridos, que medidas especiais se impunham.

Tratava-se, sobretudo, de uma crise de transporte [37]. Para a empresa do porto, residia o remédio numa melhor disposição por parte da Estrada de Ferro Santos a Jundiaí. Antes de que se compreendessem na obra de servidão do porto, com o resultado que tanto veio beneficiando São Paulo, as duas companhias andariam testilhando.

"O que é necessário, escreveu a diretoria da empresa, ao respectivo ministro (16 de novembro de 1891), é que a Estrada de Fero de Santos a Jundiaí, única que vem ao mesmo porto, aumente o seu tráfego de modo a dar escoamento a milhares de toneladas de mercadorias destinadas ao interior e que por falta de meios de condução ficam em Santos obstruindo as pontes, as ruas marginais do porto ou a bordo dos saveiros. Acresce mais que a ponte que a mesma estrada de ferro possui só descarrega do navio para o vagão, quando poderia fazer uma descarga dez vezes maior se quisesse descarregar as mercadorias para serem armazenadas enquanto ela não tem meios de transportá-las para o interior. Feito isto, não terá o porto de Santos dificuldade alguma, tanto mais que dentro de um mês esta empresa poderá entregar ao tráfego um trecho de cerca de 300 metros de cais que será de grande utilidade se os destinatários retirarem em tempo as suas cargas; no caso contrário, dentro em poucos dias ficará entulhado, como está todo o litoral, de volumes destinados ao interior pois que para o comércio local há suficiente número de armazéns para receber a sua carga".

Já em 1890 havia o próprio ministro da Fazenda, que era ninguém menos do que Ruy Barbosa, visitado o porto, para as necessárias medidas de emergência. Depois de ter ouvido o comércio e a indústria local, determinou s. ex. a construção de armazéns e de uma ponte provisória, com o que se congratulou a Associação Comercial da Cidade
[38]. Mas não bastava. E uma junta de representantes do mesmo comércio e indústria, constituída em São Paulo, assim se queixou ao presidente da República (1892):

O porto de Santos, o único porto deste Estado francamente aberto à navegação de longo curso, acha-se no mais deplorável estado.

Sem cais e sem meios de descargas, assolado pela febre amarela e pela varíola, com uma alfândega desmantelada, que não possui um guindaste, que não possui armazéns para receber e acondicionar as mercadorias, que não possui o pessoal suficiente para as conferir e despachar com a indispensável presteza, que não possui até os mais necessários utensílios, tendo a sua baía coalhada de navios que esperam há longos meses que lhes chegue a vez de descarregar, tendo as ruas e praças da cidade atulhadas de mercadorias de toda a espécie, expostas ao tempo e à rapinagem, vendo morrer diariamente a tripulação dos navios em estadia, dizimada pela febre amarela, tal é o triste espetáculo que hoje oferecem o porto e a cidade de Santos aos olhos do mundo inteiro [39].

Menos veemente não era o depoimento da Associação Comercial local, na representação que, aos 20 de junho de 1892, dirigiu aos poderes públicos:

Verdadeira anarquia reina em quase todos os serviços de Santos; os armazéns da Alfândega, as pontes, os armazéns particulares, as praças e ruas públicas, acham-se empilhadas de mercadorias, a maior parte sujeita às intempéries e ao roubo.

A gatunagem tem tomado súbito impulso; quadrilhas para tal fim organizadas dão caça às mercadorias assim abandonadas e a polícia sente-se impotente para dominar essa nova indústria, porque nem de força púbica dispõe.

E depois de acentuar que o carreto desde o litoral ou a alfândega até à São Paulo Railway se fizera, em condições normais, a 1$000 e 2$000 por tonelada, e que em 10 horas de trabalho diário uma carroça dava 10 a 15 viagens, concluía:

O preço do carreto subiu a 10$000 e 12$000 por tonelada. Avaliando em 800.000 toneladas as mercadorias que transitam anualmente por Santos, e que suportam, devido a este estado anormal, um acréscimo de carreto na média de 10$000 por tonelada, temos só aí oito mil contos de réis com que é onerado o comércio.

Acrescentem-se mais a esta cifra as rapinagens nos depósitos, os desfalques que sofrem os volumes durante o pequeno transporte urbano, e teremos a conta exata do prejuízo que resulta atualmente deste serviço.

Existem no porto de Santos nada menos de cem pontões; os seus aluguéis diários variam entre 150$000 a 350$000. Há agências de vapores nesta cidade que, mensalmente, pagam quantia superior a cem contos de réis pela locação de pontões, e tomando a média de 200$000 para cada pontão temos a cifra de 7.300:000$000, que anualmente paga o comércio pelos tais armazéns flutuantes.

O frete subiu de 50 a 100%; as estadias estipulam-se até por 400$000 diários. Acima ficou dito que o aumento do preço do carreto em Santos podia-se calcular em 8.000:000$000.

Temos mais a acrescentar, aluguel de pontões 7.300:000$000; acréscimo de frete marítimo (50 a 100%, ou sejam 60.000 libras ao câmbio atual) 13.000:000$000; estadias de navios, avaliadas em 2.500:000$000, ao todo 30.800:000$000.

Foi quando visitou o cais e o porto, outro secretário de Estado, o ministro da Viação e Obras Públicas. Colaborador de um governo provisório, Ruy Barbosa tinha podido decretar algumas medidas de emergência, por simples deliberação executiva. E o resultado não foi pequeno. Auxiliar já de uma administração constitucional, o dr. Innocencio Serzedello Corrêa pôs num contrato com a empresa as medidas extraordinárias resultantes do decreto referido no capítulo anterior e tão debatido depois (n. 942, de 15 de julho de 1892). Atacado pelas medidas deste decreto, s. ex. defendeu-se, conforme veremos adiante. As dificuldades do porto eram, entretanto, estas (Câmara dos Deputados, 23 de outubro de 1896):

Era medonho o espetáculo de Santos, tudo quanto tinha fortuna, tudo quanto era comércio, tudo quanto tinha interesse radicado ao solo, à produção e ao desenvolvimento de São Paulo, desanimado diante da crise extraordinária que atormentava o porto, se resignava ao prejuízo e abandonava riquezas colossais.

Milhares e milhares de pilhas de madeiras apodreciam, inúmeros barris de vinho esvaziavam-se, maquinismos sem número arruinavam-se. Os carroceiros faziam as mais espantosas exigências ao mesmo tempo que vários navios levavam oito, nove e dez meses, ano mesmo, para poderem fazer a sua descarga, de modo que aqueles que tinham as suas mercadorias dentro desses navios, entendiam que era preferível perder a própria cara; os próprios donos de navios chegaram mesmo a vendê-los, chegando alguns a abandoná-los!

Quando a maré baixava, ficava descoberto um lamaçal enorme, que empestava a cidade e ia constantemente levar ao Estado de São Paulo e à capital os germes da peste. A empresa do cais de Santos, reduzida, em virtude justamente das condições especiais da vida, das dificuldades criadas pelos transportes, a executar as suas obras lentamente, não podia prestar na ocasião os serviços que dela se podiam esperar.

Foi nessa ocasião que entendi obrigar a empresa a levar até à ponte da Estrada de Ferro Ingleza o cais em um curto espaço de tempo. Estabeleci uma multa de 500 contos, se a empresa não levasse a efeito, no tempo determinado, essa construção, talvez mais do dobro, senão o triplo, daquilo que estava construído.

Fiz alguns favores à empresa para obter este resultado, favores insignificantes, pequeninos, feitos a um contrato celebrado pelo governo da monarquia, quando o câmbio estava a 27 e que tinha de ser executado com o câmbio de 9 e de 10, quando os salários eram elevadíssimos e os trabalhadores fugiam diante da peste do porto de Santos, quando os carroceiros exigiam preços fabulosos para transportes de mercadorias que deviam vir das ruas até à estrada de ferro. Exigi que a empresa concluísse as obras precisas para sanear desde logo o porto em curto espaço de tempo, resolvendo a crise de transporte, diminuindo os prejuízos do Estado, e aliviando São Paulo da invasão da febre amarela; exigi trabalho de dia e de noite e a tudo aquiesceu a empresa.

Com a elevação do prazo da concessão, a relevação da multa de 500 contos ia fornecer, contra a empresa, mais tarde, munição permanente. Obra nova, com pontos de ajuste dependentes de mais de um ramo de administração pública, era natural que as Docas de Santos se adaptassem às circunstâncias em que se iam desenvolvendo, para sofrer com elas ou com elas se beneficiar. Remédio material à crise do porto, o cais seria, sempre e cada vez mais, um freio moral, pela fiscalização que assim se exerceria sobre as rendas aduaneiras.

Era neste aspecto que as Docas iam enfrentar, no princípio, maior campanha, porque, compensando o capital com as taxas a cobrar, a empresa seria, de fato, tão interessada quanto o Tesouro na boa arrecadação. Ramiro Barcellos diria no Senado, em 1895, que, devido a manobras fraudulentas, as alfândegas do Brasil arrecadavam apenas dois terços do que deviam, denunciando, com sensação, o chamado despacho por empreitada
[40].

Em Santos, exporia s. ex. que, apenas inaugurado o primeiro trecho do ais, subiriam as rendas – sem acréscimo notável de tonelagem -, de 11 mil contos, máximo até então obtido, em 1891, a 24 mil em 1892 e 27 mil em 1893 [41]. Antes, sob o Império, já um deputado à Assembleia Provincial de São Paulo ligara a obra do cais à da boa arrecadação, num discurso veemente. Foi Cunha Moreira que assim falou, em 1884:

O SR. CUNHA MOREIRA – Vou dizer uma verdade que assombra, mas que infelizmente é uma verdade real! Os desfalques que sofrem as repartições fiscais de Santos sobem anualmente à fabulosa soma de três mil contos…

O SR. MOREIRA DE BARROS – Realmente! A terça parte da renda!

O SR. CUNHA MOREIRA - … importância dos direitos extorquidos, das mercadorias que passam por contrabando, descarregadas a maior parte na ponte da Estrada de Ferro Ingleza. É preciso pôr cobro quanto antes ao descalabro dos dinheiros públicos; e o único meio de evitá-lo está em vossas mãos, meus nobres colegas. Votai a construção do cais já, independente de novos estudos (e neste sentido mandarei uma emenda ao substitutivo, pois os estudos feitos são mais que suficientes para começar-se as obras) que só tem por fim protelar este grande cometimento tornando um pouco lenta a prosperidade da Província, e só favorecer os contrabandistas.

Autorizai já esta medida, que não só elevareis este rico torrão à altura a que tem jus, tornando o principal porto da Província de São Paulo franco e acessível dia e noite, para carga e descarga, para entrada e saída dos navios de quaisquer dimensões, e sempre debaixo da vigilância fiscal, como também fareis que essa enorme cifra, de que há pouco falei, seja de ora avante arrecadada, acompanhada de outra equivalente, proveniente da concorrência em larga escala e direta do comércio de importação e exportação, que se estabelecerá entre o porto de Santos e a maior parte dos portos do mundo!

Acelerai a chegada desse dia! Meditai profundamente no valor moral da obra do cais, e estou certo que a votareis com frenesi e entusiasmo, porque a sua execução é o cumprimento do art. 1º do programa para o desenvolvimento, livre de todas as peias, do futuro grandioso da Província de São Paulo
[42].

Imagem: reprodução parcial da página 30


[35] A imprensa, que tanto ia ocupar-se com a empresa, limitou-se a publicar um pequeno comunicado dela, com estas palavras: "Passada esta crise epidêmica, esperam os srs. Gaffrée, Guinle & Companhia, que todos os meses haja um novo pedaço a trafegar". Diario de Santos, de 4 de fevereiro de 1892.

[36] Das estatísticas do tempo: "A importação em 1880/81 figura com o valor oficial de 8.563.667$389; em 1889/90, de 30.202:260$077. Em dez anos notou-se um aumento de 352%. A exportação de café em 1880/81 foi de 1.804.388 saas, de 60 quilos; em 1889/90, de 2.041.503. Em dez anos aumentou quase cento por cento".

[37] Já, então, a segunda linha férrea entre Santos e a Capital se apontava como remédio ao congestionamento. "Parece-nos, portanto, que devemos antes levantar bem alto o nosso brado, pedindo a solução de um problema que se dispõe há alguns anos, e que não pode ser adiado, como seja a construção urgente de uma linha férrea, que ligue o porto de Santos ao interior do Estado… Se na atualidade estamos em presença de tamanhos embaraços, o que se poderá prever quando tivermos uma safra de seis milhões de sacas de café a exportar e uma importação que deixe pelo menos na nossa alfândega um saldo mensal de cinco mil contos de réis?" Diario de Santos, 17 de outubro de 1891.

[38] Lê-se no Relatorio de 20 de junho de 1891: "O parecer da comissão foi aceito pelo dr. Ruy Barbosa, sendo a execução das obras, no mesmo dia, confiada à empresa do cais, sob fiscalização do dr. Domingos Sergio de Saboia. Fez portanto o dr. Ruy Barbosa, em dois dias, o que os seus antecessores não souberam fazer em alguns anos! É por todos sabido como a empresa do cais se desempenhou dessa incumbência. Nunca se fez em Santos uma obra tão importante em tão pouco tempo".

[39] Dirá a este respeito o Diario de Santos, em 1896: "A Alfândega de Santos era uma Babel. O sr. Rodrigues Alves, então como hoje, ministro da Fazenda, sabia de tudo isto. Tendo mandado a Santos o contador do Tesouro, Rodopiano Padilha, este disse, no relatório, que em 25 de janeiro de 1892 lhe apresentou: '…numa alfândega como a de Santos, quase tudo está por fazer… pode-se dizer, raro é o trabalho que obedece rigorosamente às prescrições fiscais e ainda ao método, que em todo e qualquer estabelecimento constitui elemento diretivo de sua economia… É admirável que uma alfândega como a de Santos se ressinta de aparelhos tais! Dir-se-ia que ao Governo tem faltado o conhecimento exato do estado rotineiro senão de abandono, em que se acha repartição tão importante". A Companhia Docas de Santos e a Alfândega de São Paulo, 1ª série, cit., página 41.

[40] A praxe clandestina mais comum era o despacho por empreitada. "O Senado não sabe provavelmente que despachos são estes. Explico em síntese: o comerciante chama o despachante para desembaraçar-lhe a fatura, calcula os direitos pela tarifa; suponhamos que montam a 12:000$000. O despachante contrata o despacho por 8:000$000, efetua-o na Alfândega, pagando 2:000$000 e, líquido final, o comerciante economiza 4:000$000, o despachante ganha 4, o pobre do fisco teve 2:000$000 e o resto o sr. conferente encarrega-se de distribuir pela pobreza". Ramiro Barcellos, Senado, 14 de dezembro de 1895.

[41] "Dois fatos extraordinários resultaram da inauguração do serviço do cais; a renda aduaneira elevou-se ao dobro no exercício de 1892 e libertou-se o comércio da mais temerosa desorganização e anarquia que se tem visto no serviço de um porto alfandegado; ali chegavam os navios do exterior e ficavam por longos meses, até anos, presos no porto sem poderem se desembaraçar de seus carregamentos; por toda a parte rolavam todas as mercadorias, em pontões alugados a 300$000 e 400$000 diários, nas pontes, em cascos de navios velhos abandonados, em armazéns alfandegados às pressas, nos corredores, nas ruas, nas ilhas e até nas praças". Ramiro Barcellos, Senado, 14 de dezembro de 1896.

[42] A chamada ponte inglesa, construída pela São Paulo Railway para as necessidades da estrada e também por ela cedida a outros despachos, mediante remuneração, constituiu matéria de longa polêmica, pelo contrabando que nela se fazia e os tropeços levantados à sua destruição. Cunha Moreira foi veemente a tal respeito. A história da ponte é parte importante da portuária, nesses tempos. "A São Paulo Railway, simples empresa de transporte, lê-se num papel do tempo, construiu aquela ponte para servir de dependência provisória à sua estação em Santos, mero desvio, pode-se assim dizer, que tinha de durar até quando se iniciassem as obras do cais. O fim que aquela companhia teve em vista, bem se compreende, era facilitar a descarga dos navios que traziam seus materiais, conseguindo destarte fretes mais baratos que qualquer outro carregador e poupando as despesas de carreto urbano. A economia que fazia nestas duas verbas compensava a sua conservação". Ver As Companhias de Estrada de Ferro de São Paulo e a Companhia Docas de Santos, São Paulo, Typ. Gerke & Companhia, 1896, pág. 30.