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HISTÓRIAS E LENDAS DE CUBATÃO - HISTÓRIA - BIBLIOTECA NM
A História Econômica de Cubatão (1)

Com o título: "Entre estatais e transnacionais: o Pólo Industrial de Cubatão", esta tese foi defendida em janeiro de 2003 no Instituto de Economia da Universidade de Campinas (Unicamp) pelo professor-doutor Joaquim Miguel Couto, de Cubatão, que autorizou sua transcrição em Novo Milênio:

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ENTRE ESTATAIS E TRANSNACIONAIS: O PÓLO INDUSTRIAL DE CUBATÃO

Prof. Joaquim Miguel Couto

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Introdução
"Fale de sua aldeia e estará falando do mundo."
Leon Tolstói (1828-1910)


A tradição do Cruzeiro Quinhentista e a modernidade das indústrias: assim é Cubatão
Foto: João Vieira, in jornal A Tribuna, 9/4/1993, caderno especial Cubatão 44 anos

Essa é a história de um parque industrial, localizado na singela cidade de Cubatão (SP). Pequena e sinistra aos olhos do viajante do início do século XXI, a cidade tornou-se um exemplo perfeito para entender o século industrial brasileiro. A evolução do capitalismo, manifestado em seu desenvolvimento industrial em Cubatão, apresenta-se como progresso e catástrofe num mesmo tempo e lugar.

A década de cinqüenta do século XX foi um período de grande esperança para o país. Observada a distância, tornou-se a nossa era de ouro. Onde havia chaminés e fumaça, havia progresso e emprego, ilusão e perspectivas de dias melhores. Cubatão foi apanhada por essa onda de otimismo em relação ao futuro, quando, em 1950, foi escolhida como local da maior obra industrial de seu tempo: a refinaria de quarenta e cinco mil barris diários (instalada ao lado da Usina Henry Borden de energia elétrica). Em seguida, vieram as indústrias petroquímicas transnacionais, a grande siderúrgica estatal e os complexos de fertilizantes nitrogenados e fosfatados. 

O Plano de Metas de Juscelino Kubitschek, símbolo maior de toda uma década, citava Cubatão, nominalmente, em cinco setores: energia elétrica (Meta 1); refinação de petróleo e petroquímica (Meta 5); fertilizantes nitrogenados e fosfatados (Meta 18); e siderurgia (Meta 19).

Aço, petróleo e energia elétrica num mesmo município e situados numa extensão de apenas seis quilômetros. Essa combinação, única na história industrial brasileira, nos levou à seguinte pergunta: por que Cubatão? O que fazia daquelas terras de serra abaixo, entre o porto marítimo de Santos e o Planalto Paulista, o local escolhido para sediar a capital da indústria de base brasileira?

Responder essa pergunta é um dos objetivos desse trabalho, assim como estudar a própria constituição e desenvolvimento do Pólo Industrial de Cubatão ao longo dos últimos cinqüenta anos: seu sucesso e seus problemas.

Como objetivo secundário, o trabalho busca compreender as conseqüências sociais e econômicas que a dinâmica da industrialização trouxe para o município. De pequeno povoado no sopé da Serra do Mar, ainda no final dos anos 40, Cubatão tornou-se, em apenas 26 anos, numa das maiores cidades industriais do Brasil. Para entender a rápida transformação pela qual passou o município, entretanto, não basta analisar o processo de industrialização que se desenvolveu a partir de 1950, mas também saber o que existia nessas terras antes da chegada da grande indústria.

Para responder nossa pergunta e investigar o desenvolvimento industrial ocorrido em Cubatão, dividimos o trabalho em quatro capítulos. No primeiro, intitulado Indústrias pioneiras no mundo das bananeiras, traçamos, a princípio, a evolução histórica da região de Cubatão, do século XVI ao final do século XIX: recordamos os caminhos construídos na Serra do Mar, o Porto Geral do Cubatão, a barreira fiscal, a construção do aterrado entre Santos e Cubatão e as conseqüências do início do funcionamento da Estrada de Ferro São Paulo Railway.

Em seguida, explicamos os motivos da instalação e desenvolvimento das indústrias pertencentes à primeira fase industrial de Cubatão, as chamadas indústrias pioneiras, ainda na primeira metade do século XX: Costa Moniz (1912), Companhia de Anilinas e Produtos Químicos (1916) e Companhia  Santista de Papel (1922).

Esses empreendimentos nacionais privados, de grande porte para a época, posicionaram essas indústrias entre as maiores do Estado de São Paulo. No entanto, esse crescimento industrial não deslocou a principal atividade econômica da região, a cultura comercial da banana, que empregava a maioria dos habitantes. Ainda neste capítulo, consideramos as motivações que envolveram a construção da primeira transnacional de Cubatão, a Usina Henry Borden.


Rara foto da época da construção da Usina Henry Borden
Foto cedida por Marcelo Tálamo, sites EFBrasil/811Henschel

No segundo capítulo, denominado Os gloriosos anos cinqüenta: a implantação da Refinaria Presidente Bernardes e a constituição do primeiro pólo petroquímico brasileiro, revelamos a disputa travada no centro do poder para trazer a maior refinaria do país, na época, para São Paulo e não para o Rio de Janeiro. Estudamos os motivos que levaram Cubatão a ser escolhida para sediar a grande refinaria de 45 mil barris, bem como sua implantação e evolução ao longo dos anos.

Em seguida, tratamos da constituição do primeiro pólo petroquímico brasileiro, representado pela instalação de quatro grandes indústrias transnacionais: Union Carbide, Companhia Brasileira de Estireno, Alba e Copebrás. A partir desta década, Cubatão transforma-se numa cidade industrial, e suas plantações de banana são dizimadas. No censo industrial de 1960, realizado pelo IBGE, Cubatão já surgia como o quarto município de maior valor da transformação industrial do Estado de São Paulo (abaixo de São Paulo, Santo André e São Bernardo do Campo).

Ainda neste capítulo, indicamos que a década de 50 também foi marcada pela ruptura com o tipo de indústria existente até então. As novas empresas que procuraram Cubatão não eram mais as simples indústrias de bens de consumo, mas, sim, indústrias produtoras de matérias-primas básicas para outras indústrias. Eram as chamadas indústrias de base, produtoras de bens intermediários, intensivas em capital e de grande escala de produção, caracterizadas como dinâmicas por propiciarem o crescimento de outros ramos industriais.


Instalações da Refinaria Presidente Bernardes, em foto de 1956
Foto de Boris Kauffmann, no Guia Santista (Tourist Guide to Santos) de 1956, Santos/SP

Já no terceiro capítulo, A primeira siderúrgica marítima brasileira e o complexo de fertilizantes de Piaçaguera, discutimos a diversificação industrial por que passou Cubatão ao longo das décadas de 60 e 70. Tratamos da implantação da siderúrgica Cosipa (de enorme quantidade de capital e trabalho), dos complexos de fertilizantes nitrogenados e fosfatados, da indústria do cloro e das chamadas indústrias satélites, vinculadas ao fornecimento de insumos a outras indústrias. Destaca-se o papel desempenhado pelo capital estatal e transnacional aplicado em Cubatão, bem como sua superioridade em relação ao capital nacional privado, ao mesmo tempo em que analisamos o conjunto industrial como um todo, tendo por base os censos do IBGE e da Prefeitura de Cubatão.

No final do capítulo, podemos afirmar que, ao mesmo tempo em que o Brasil atingia o status de país industrial (final dos anos 70), Cubatão se firmava como um dos maiores parques industriais da América Latina, estando no Censo Industrial do IBGE, de 1980, classificado na terceira posição do Estado de São Paulo em valor da produção industrial (atrás apenas de São Paulo e São Bernardo do Campo).

A afirmação de João Manuel Cardoso de Mello e Fernando Novais nos dá conta do que representou o período em que Cubatão se industrializou: "Os mais velhos lembram-se muito bem, mas os mais moços podem acreditar: entre 1950 e 1979, a sensação dos brasileiros, ou de grande parte dos brasileiros, era a de que faltava dar uns poucos passos para finalmente nos tornarmos uma nação moderna" (Mello & Novais, 1998:560). Neste início do século XXI, percebemos que a modernidade atingiu apenas um segmento da população brasileira, enquanto uma outra parte ainda vive dos sonhos de sua realização.


Instalações da Cosipa em Cubatão
Foto: Cosipa, cerca de 1990

Por fim, o quarto capítulo, intitulado Crise ambiental e reestruturação produtiva (as décadas de 80 e 90), está dividido em duas partes. Na primeira, apresentamos a história da crise ambiental de Cubatão, deflagrada no início dos anos 80, e seus reflexos no Pólo Industrial. São levantados os casos de anomalias congênitas e a explosão de Vila Socó (que resultou entre 500 a 700 pessoas desaparecidas extra-oficialmente), que tornaram a cidade conhecida como o Vale da Morte. Buscamos, ainda, explicações para a instalação de apenas uma nova indústria (AGA S/A) durante toda a década de 80.

Na segunda parte do capítulo, analisamos a reestruturação produtiva por que passou o Pólo Industrial de Cubatão durante os anos 90, bem como da privatização de suas empresas estatais e da desnacionalização de seu complexo de fertilizantes. Evidenciamos que, ao contrário de outras cidades da Grande São Paulo, que passaram ou passam por um processo de desindustrialização, Cubatão saiu fortalecida da década de 90, com sua produção industrial alcançando níveis recordes.

Uma das chaves para entender o crescimento industrial de Cubatão é a água. Esta substância é a responsável básica por tudo que se criou em Cubatão através dos tempos. Constitui o seu principal bem natural e a razão fundamental da instalação da grande Usina Hidrelétrica Henry Borden (construída pela empresa canadense Light and Power, em 1926). A Henry Borden é o marco divisor da história industrial de Cubatão. Seu papel indutor no processo de industrialização paulista ainda merece um melhor reconhecimento.

Cubatão, cidade pioneira de tudo que é bom e ruim advindo do processo de industrialização brasileira, está à espera de sua redenção. Sua evolução de pacato vilarejo rural à condição de cidade urbana industrial é ilustrativo das transformações vividas pelo Brasil durante o século XX. Mas uma pergunta sempre vem à tona: Cubatão, sucesso ou fracasso?


Área industrializada de Cubatão, no sopé da Serra do Mar
Foto: Cesar Cunha Ferreira, 14/5/2004