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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS
A praça (que não é mais) dos fotógrafos (1)

Conhecidos como lambe-lambes, em função de sua técnica de reaproveitamento das chapas fotográficas nas máquinas tipo caixão, os fotógrafos de rua de Santos acabaram se concentrando na Praça dos Andradas, até desaparecerem na década final do século XX. Na obra Veja Santos! (edição do autor, 2ª ed., 1975, Santos/SP), em que conta a origem e o significado do nome de cada rua santista, o jornalista Olao Rodrigues assim se referiu a essa praça:


Praça dos Andradas em 1979
Foto: Santos Obras 74/79, edição PMS/Prodesan, gestão Antônio Manuel de Carvalho

Andradas (Dos)
Praça - Bairro: Centro
Encontrada nos ângulos da Rua Visconde de São Leopoldo, Rua Amador Bueno, Rua XV de Novembro e Rua Visconde do Embaré

Antes de ser aberto, em grande parte o logradouro era ocupado pelo Campo da Chácara, como em 1822, ano da Independência, pois em sua área ficava a chácara de Antônio José Viana. Na sessão da Câmara Municipal realizada a 28 de dezembro de 1865, sob a presidência do Visconde de Embaré, foram alterados os nomes e limites de algumas vias públicas, como o pátio onde estava edificada a Cadeia, que passou a denominar-se Praça Andrada, mais tarde substituída para Praça dos Andradas. O seu jardim foi inaugurado a 10 de dezembro de 1822, às 17 horas, em ato presidido pelo vereador Francisco Emílio de Sá, representando a Câmara Municipal, e abrilhantado pelas bandas musicais Luso-Brasileira e 15 de Abril. A praça era toda cercada de gradil de ferro, mais tarde removido, em grande parte, para o Grupo Escolar Dr. Cesário Bastos.

Na sessão que a Câmara Municipal realizou a 7 de agosto de 1891, sob a presidência do coronel Francisco Correia de Almeida Morais, o vereador Elisiário de Arruda Castanho apresentou indicação, aprovada, em que o Conselho de Intendência era autorizado a despender a importância de 2:400$000 a fim de ser paga à corporação musical que fosse julgada a melhor da Cidade para, aos domingos e feriados, das 17 às 19 horas, tocar no jardim da Praça Andrada.

Praça dos Andradas, que se incorporava à Planta sob nº 56, foi oficializada pela Lei nº 647, de 16 de fevereiro de 1921, sancionada pelo prefeito municipal, coronel Joaquim Montenegro.

Quando a Praça dos Andradas ainda era denominada Praça do Andrada ou na sessão que a Câmara Municipal realizou a 26 de fevereiro de 1896, presidida pelo Sr. Antônio Iguatemi Martins, foi apreciado o parecer nº 389, da Comissão de Obras e Viação, que acolhia a indicação autorizando o intendente municipal a mandar consertar e pintar o gradil da Praça do Andrada, oferecendo o vereador João Pereira Bueno emenda aditiva no sentido de que se estendesse o serviço de pintura às grades do jardim da Praça Mauá. Parecer e emenda foram aprovados por unanimidade.

Na sessão ordinária que a Câmara Municipal realizou a 19 de setembro de 1900, sob a presidência do sr. Joaquim Feliciano da Silva, foi apreciado o parecer nº 117, da Comissão de Obras e Viação, que aprovava a indicação do vereador Martins Menezes autorizando o intendente municipal a comprar 50 bancos para serem instalados no jardim da Praça do Andrada, bem como a compra de 20 outros para a Praça José Bonifácio. Foi o parecer aprovado, contra o voto do tenente-coronel Ascendino Moutinho.

Totalmente remodelada, sobretudo seu ajardinamento, a Praça dos Andradas foi inaugurada no dia 26 de janeiro de 1959, como parte saliente dos festejos comemorativos do 120º aniversário da elevação de Santos à categoria de cidade, em cerimônia presidida pelo prefeito municipal, que era o engenheiro Sílvio Fernandes Lopes.

Mauá & Cia., a firma dirigida pelo Visconde de Mauá, que tinha um banco na atual Rua Frei Gaspar, nº 6, estava falida mas dispunha de imóveis no Município. Na Praça Andrada, por exemplo, havia pequenos ranchos, já em estado de ruínas, que pertenciam à massa falida de Mauá & Cia. Em sua sessão de 27 de junho de 1879, presidida pelo sr. João Otávio dos Santos, a Câmara Municipal propôs a desapropriação do terreno onde se situavam aqueles rústicos imóveis por ser o espaço julgado necessário ao prolongamento da Rua Amador Bueno.

Em 1880, o jardim da Praça do Andrada, hoje Praça dos Andradas, tinha plano para completa reforma. Na sessão da Câmara Municipal realizada a 21 de janeiro de 1880, presidida pelo Dr. Alexandre Rodrigues, o vereador Francisco Emílio de Sá, aludindo aos serviços de melhoramento que se introduziriam naquele logradouro, indicou que a Municipalidade mandasse levantar um orçamento do custo de um gradil para circundar a praça pública. Foi a propositura encaminhada à Comissão de Obras para formular o orçamento.

Anos depois, já efetuados os serviços de melhoramento na Praça Andrada, ou na sessão que a Câmara Municipal realizou a 9 de julho de 1887, o vereador Oliveira Pinto indicou a conveniência da construção de um coreto naquela praça pública, que em nossos dias tem o nome de Praça dos Andradas.

Como é de inferir, é mais uma homenagem pública aos Irmãos Andradas - José Bonifácio, Martim Francisco e Antônio Carlos - que dignificaram o berço natal e se tornaram vultos dos mais salientes da vida política, social, administrativa e cultural do Brasil, notadamente por ocasião da empolgante cruzada que deu à Pátria a aspirada Independência.

Canto da Praça dos Andradas, entre a Cadeia Velha e a atual Rodoviária, no início do século XX. Ao fundo, a antiga Santa Casa no Monte Serrat
Foto: Poliantéia Santista, de Fernando Martins Lichti, 3º vol., Gráfica Prodesan, Santos/SP, 1996

A praça dos fotógrafos - Essa praça foi o único parque artificial (organizado e plantado pelo homem) antigo, e já se chamou Campo da Chácara (em 1820/1860) e Pátio da Cadeia Nova (1860/1870). De 1870 em diante, após a inauguração da Nova Cadeia, Câmara Municipal e Fórum, a área foi sendo arborizada gradualmente, primeiro com pinheiros, depois com palmeiras, coqueiros, figueiras brancas, eucaliptos, bambus imperiais, árvores do viajor, carvalhos, ficus e até jequitibás, formando um bosque fechado, cheio de sombra e de pássaros, com fontes, bebedouros, lagos, pontes semi-arqueadas, grades artísticas (mais tarde retiradas) e muitos bancos para os frequentadores.

Chegou a ser uma praça-bosque tradicional, principalmente a partir da inauguração, em um de seus lados, do Teatro Guarani, em 1882. Existiu inclusive uma casa para o jardineiro, no meio do bosque, posteriormente demolida. A partir do início da Segunda Guerra Mundial, a praça começou a ser modificada, reduzindo-se o arvoredo. Começou um processo de degradação, apesar de ser tombada pela Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (junto com o edifício da Cadeia Velha, depois transformado em Casa da Cultura de Santos).

Mesmo assim, foi palco de inúmeros eventos nas décadas finais do século XX, como feiras folclóricas e local de apresentações musicais. Nos últimos anos daquele século, indigentes dormiam nos bancos ao redor das árvores, ali mesmo faziam suas necessidades fisiológicas e se banhavam na fonte, e a parca iluminação tornava o local perigoso de atravessar, com a presença de vigaristas e outros marginais.


Um fotógrafo lambe-lambe na Praça dos Andradas
Foto: Araquém Alcântara, divulgada no site São Vicente na Memória (acesso em 25/9/2012)

Durante o dia, os lambe-lambes ainda teimavam em exercer ali a sua profissão, geralmente único meio de subsistência, ao lado de ciganas leitoras da sorte, alguns engraxates tradicionais, bancas de livros e revistas usados e algum ocasional camelô demonstrando seus produtos com truques circenses para atrair o público. Quem atravessava a praça erguia os olhos para o arvoredo, tentando vislumbrar - e raramente conseguindo - algum dos bichos-preguiça que viviam em suas árvores. Era notícia de jornal quando um deles caía de uma copa de árvore, por exemplo.


Detalhe da imagem da praça em 1979, mostrando o equipamento do lambe-lambe
Foto: Santos Obras 74/79, edição PMS/Prodesan, gestão Antônio Manuel de Carvalho

Pioneiros - Contava o jornalista Olao Rodrigues (em seu Almanaque de Santos, 1972) que o primeiro fotógrafo profissional de Santos apareceu em 1853, instalado no Largo do Chafariz (hoje, Praça Visconde de Mauá), onde "tirava retratos pelo novo [?!] sistema Daguerreotypo". O artista, procedente de Paris, fazia fotos também a domicílio.

O segundo fotógrafo em Santos foi Henrique Deslandes que, vindo da Corte (Rio de Janeiro), em 1858 abriu ateliê no prédio de número 31 da Rua Septentrional (lado direito da atual Praça da República) e anunciava "tirar retratos pelo sistema Ambrotypo e Photographia, com perfeição desejada, seja qual for o tempo. Aberto das 10 às 14 horas".

Um ano depois, outro fotógrafo se estabeleceu na Cidade, na Rua Antonina (trecho da Rua 15 de Novembro, entre as ruas do Comércio e Frei Gaspar), e em 1861 apareceu anúncio nos jornais, do profissional J. J. Miller, com estúdio na Rua da Praia (atual Tuiuti), 36, que "usava os methodos photographia, ambrotypia e panotypia".

O foto-amador Hernando A. D'Almeida possuiu o primeiro filmador da Baixada Santista. Era da marca Debrue (acompanhado de aparelho de revelar o filme) e fez sucesso em 1913.

As fotos mais antigas de Santos datam de 1863/65, mostrando a área central da cidade e o porto, e foram produzidas por Militão Augusto de Azevedo. J. Marques Pereira foi o primeiro repórter-fotográfico de Santos, tornando-se bastante popular no início do século XX.

Na série Conheça o seu Bairro, ao enfocar o Centro, a jornalista Leda Mondin citava, em 3 de março de 1983: "Santos está perdendo mais um pouco da sua tradição: só restam dois dos tradicionais fotógrafos que retrataram a praça e os visitantes que a ela acorriam nos últimos 60 anos. Sabe-se lá quanto tempo mais esses dois últimos vão resistir". Em 2001, a área foi reformada e revitalizada, mas ganhou gradeamento em seu perímetro. E os fotógrafos desapareceram. Em 2012, o que desapareceu foi o gradeamento, em nova revitalização da área:


Texto-legenda em 2012: "PRAÇA DOS ANDRADA É REVITALIZADA - A Prefeitura de Santos entregou ontem, às 18 horas, as obras de revitalização da Praça, no Centro. Além da retirada das grades deterioradas, a praça recebeu iluminação mais potente, recuperação da fonte, revisão do piso, limpeza da rede de drenagem junto à ciclovia, serviços de jardinagem e poda de árvores."
Foto: Matheus Tagé, publicada no jornal Diário do Litoral, 25 de setembro de 2012, página 1


Praça dos Andradas no final do século XX
Foto: arquivo A Tribuna

Escritos
Viagem à Praça dos Andradas

Campo da Chácara era o nome original do lugar onde surgiria a praça, que um dia teve coreto

Narciso de Andrade (*)

A intimidade que adquirimos no convívio de tantos anos acho que me permite tratá-la sem formalismo, em tom coloquial, como é próprio nas melhores conversas. Quando fomos apresentados? Não sei, tantos anos... Estou vendo um menino deslumbrado no meio de um jardim habitado árvores imensas conduzido por uma senhora de rara nobreza no porte, nos gestos, na maneira de conduzir uma criança fascinada.

Era o espaço que ele procurava para seu sonho infantil de verde liberdade. Que esse moleque, eu sei, sempre foi um irremediável sonhador.

Tudo na vida a gente fica sabendo aos poucos. Que sonhar é ofício delicado e muito perigoso. Gera rebeldia. Não sei por onde vou, não sei para onde vou, sei que não vou por aí. Estou pensando isso agora neste instante sob os efeitos da lembrança do menino em lance de teimosia querendo subir na árvore da Praça. Em todas elas, e só não entendia porque ali não tinha nenhuma goiabeira. Comer a fruta de glorioso sabor e construir um estilingue especial. Depois ir caçar sabiá num certo bairro que ele conhecia muito bem.

Este estilingue entra na crônica por desfaçatez: não tem nada a ver. Não é como o bicho preguiça a me observar com seus olhos turvos de aparente indolência. Agarrado nos galhos delgados do arvoredo, equilibrista nato, vai, lenta e conscienciosamente, desvendando a paisagem lá de cima, enquanto tritura as folhas tenras. Delicadamente, como manda o figurino.

Foi uma inglesa angular que me chamou a atenção para o fato: preguiça é um bicho delicado. Aquele andar pautado é para não ferir o espaço por onde caminha. Que preguiça tem unhas não muito longas e agudas. E ela sabe disso. Mais que para proteger-se a preguiça usa da lentidão para não magoar o lugar por onde se move. Pois é por ali que chegará na hora certa, no lugar certo. Calma, minha gente.

Calma, repito, já estou voltando para a Praça onde outrora existiu um coreto como me conta a senhora que era desse tempo - o tempo dos jardins, das praças e dos coretos. É a filosofia popular, que às vezes acerta: tudo tem seu temo. Aliás, se não me engano, isso já está na Bíblia: há o tempo de plantar e o tempo de colher. Aquela senhora está plantando e numa inversão lógica, o menino quer colher. Por isso, sua ansiedade que o leva a correr para apreciar os peixinhos coloridos em elegantes evoluções na água esverdeada do lago da Praça. Lago não, é um rio que atravessava e ornamentava, pois não se escondia em seu refúgio subterrâneo de hoje. A verdade é que a Praça sofreu alterações radicais no correr dos tempos. Nunca para melhor, infelizmente. Vamos esperar que o fato não se repita.

"Era o espaço que ele procurava para seu sonho infantil de verde liberdade"

Alguns dados históricos - Campo da Chácara, alegre na sonoridade de suas vogais abertas, era como se chamava originalmente o local, nele se situava a chácara do cidadão Antônio José Viana. Em 28 de dezembro de 1865, a denominação foi alterada para Praça Andrada, em sessão da Câmara Municipal presidida pelo Visconde de Embaré. A rua com o seu nome desemboca na atual Praça dos Andradas, nome definitivo do local, como todos sabem. Mas o jardim mesmo só foi inaugurado no dia 10 de dezembro de 1882, às 17 horas, informações estas colhidas em livro do velho jornalista, velho companheiro, Olao Rodrigues, e em José da Costa e Silva Sobrinho, historiador e primeiro diretor da Faculdade de Direito da atual UniSantos.

Nos domingos e feriados a banda tocava na praça, com autorização da Intendência Municipal. Durante muitos anos, para ouvi-la, namorar, fofocar, muita gente circulou por ali. Como já disse, há um tempo para todas as coisas. No meu tempo, o ponto era o Gonzaga: agora, são os shoppings. E vá se entender a cabeça dos jovens...

A existência de um coreto data de 1887; cheguei a vê-lo, a ouvir a pitoresca e histórica banda do Corpo Municipal de Bombeiros, sob a batuta do maestro Garófalo, a executar marchas, dobrados e maxixes, e um arranjo especial da Protofonia do Guarani, do insigne compositor patrício Carlos Gomes.

A Praça dos Andradas era rodeada por uma grade de hastes de ferro em forma de lança que a protegiam. Possuo uma foto, infelizmente muito esbatida, onde ela aparece no seu melhor aspecto, com uma caleça do tipo Vitória à porta de entrada, alguns passantes em traje da época e, em frente, a casa onde residiu Martim Francisco de Andrada, o terceiro da linhagem com esse nome. Afirmo e confirmo, pois obtive a informação de Tennyson de Oliveira Ribeiro, que sabia, e muito, das coisas.

E com quem cruzei muitas vezes a Praça em nosso tempo de City. Pois a empresa canadense tinha seu escritório no local e nela trabalhamos durante anos. Do outro lado, o prédio do histórico Teatro Guarani. Hoje, ruína irrecuperável, em meu entender.

(*) Narciso de Andrade é poeta e escritor. Texto publicado na edição de 7 de junho de 1998 do caderno AT Especial/Leituras do jornal santista A Tribuna.


Praça dos Andradas no final do século XIX, com o Teatro Guarany e ao fundo a Santa Casa
Foto: Poliantéia Santista, de Fernando Martins Lichti, 3º vol., Gráfica Prodesan, Santos/SP, 1996

Referência à praça no Almanaque de Santos 1971, de Olao Rodrigues:

ATRAÇÕES DE SANTOS NO SÉCULO XIX

Segundo o Indicador Turístico, lançado em 1885, os principais passeios do Município, da época, eram os seguintes:

Praça do Andrada (que é hoje a Praça dos Andradas), "ajardinada modernamente pela Câmara Municipal, totalmente arborizada e medindo 9.748 metros quadrados; dispõe de pequenos lagos, ilhas e pontes, cercada por gradil de ferro e pitorescamente cortada por ruas caprichosamente irregulares. De um lado do jardim, o moderno Teatro Guarani e, no centro, o belo edifício da Câmara Municipal".

[...]


A mesma foto de J. Marques Pereira,  em cartão-postal enviado de Santos para a França em julho de 1907. Note-se o "Theatro Guarany", à esquerda, na esquina da quadra, em pleno funcionamento, e ao fundo as instalações antigas da Santa Casa, além de algumas residências, crianças e pessoas na rua e uma charrete. É interessante notar que a praça era toda cercada por gradis de ferro, que depois foram transferidos para o Grupo Escolar Dr. Cesário Bastos
Foto: Acervo José Carlos Silvares/Santos Ontem

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