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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - MUSEUS - 1-A
Museu de Arte Sacra de Santos (MASS)

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Não são muitos, e mesmo assim alguns são quase desconhecidos pela população, mas possuem acervos valiosos sobre temas variados, desde biologia marinha até arte sacra e história dos transportes. A criação do Museu de Arte Sacra foi enfocada em matéria de domingo, 27 de setembro de 1981 do jornal santista A Tribuna:
 


Relíquias, imagens e utensílios cerimoniais sacros estão sendo mantidos a sete chaves no Mosteiro do São Bento, prontos para serem expostos no Museu de Arte Sacra de Santos, que tem inauguração prevista para 21 de novembro. O acervo, de valor incalculável, é comparado em importância ao do Museu de Arte Sacra de São Paulo, e está sendo catalogado e restaurado pela Cúria Diocesana e pela Secretaria de Cultura do Estado. A falta de verbas oficiais, porém, impede que haja rapidez na restauração, e, por esse motivo, apenas 102 das 280 peças coletadas serão expostas inicialmente. Algumas datam de antes de 1660
Foto publicada com a matéria

Os tesouros do São Bento

Texto de Virgínio Sanches
Fotos de Rafael Dias Herrera

O imponente Mosteiro de São Bento está sitiado. Vigias particulares circulam pelo prédio e em torno dele, atentos a pessoas em atitudes estranhas. As três freiras italianas que o habitam são zelosas, evitam contato com curiosos e percorrem silenciosas seus seculares corredores. Nele só se entra com autorização expressa do bispo diocesano, d. David Picão, ou de pessoas a ele ligadas. O acesso do povo só é permitido aos sábados, durante a missa que é celebrada na capela.

O Mosteiro guarda preciosos tesouros e segredos. Tesouros mesmo, alguns com valor monetário inestimado. E são esses tesouros, 260 ao todo, que deverão ser mostrados ao público, gradativamente, a partir de 21 de novembro. Nesse dia, as pesadas portas do Mosteiro serão abertas para a inauguração do Museu de Arte Sacra de Santos. Alguns especialistas acreditam que, mantidas as proporções, o acervo é, pela sua preciosidade, equiparado ao do Museu de Arte Sacra de São Paulo.


Os corredores do mosteiro escondem tesouros da fé e da arte
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Na quinta-feira, a comissão de instalação do museu terminou o processo inicial de reconhecimento e identificação das 230 peças que deverão ser expostas. Outras 50, embora catalogadas, continuam praticamente desconhecidas dos especialistas. Mas, além destas, outras 128 imagens, quadros, paramentos e utensílios de uso sacro identificados não serão conhecidas do público tão breve: elas precisam ser restauradas, o processo utilizado é demorado, a especialidade carente de bons profissionais.

Assim, apenas 102 obras deverão estar preparadas para a admiração popular, em novembro. Estas estão todas restauradas, pelas mãos hábeis de Maria Helena Chartuni, do Museu de Arte Sacra de São Paulo; da artista plástica e futura diretora do museu, Nazareth Mota Leite, e por especialistas da Divisão de Museus da Secretaria de Cultura do Estado, que são responsáveis pela restauração dos objetos metálicos e pratarias.

Devido ao valor cultural - e monetário - que representam as obras, a comissão decidiu que elas não mais poderão ser retiradas do mosteiro, nem mesmo para as necessárias restaurações. Para isso, uma das salas do prédio será transformada em oficina. A preocupação da comissão, de não permitir a saída de peças, fundamenta-se no mistério que sempre cercou o acervo.

Desde 68, quando a criação do Museu de Arte Sacra começou a ser encarada com seriedade, o acervo permaneceu distante das igrejas e do povo. Parte dele estava em poder dos monges beneditinos, no Mosteiro de Valinhos, e outra parte - a proveniente das paróquias da diocese - sob os cuidados imediatos de d. David. E nunca, segundo Nazareth Mota Leite, estiveram em casas particulares, como se chegou a divulgar. O desencontro de informações, aparentemente, tinha como função desestimular e confundir as pessoas que poderiam tentar roubá-las.


São Bento, criador da Ordem dos Beneditinos
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Amaro é Bento - Há alguns anos, com a chegada a Santos da parte do acervo conservada pelos beneditinos, foi iniciado o processo de pesquisa, reconhecimento e identificação das peças. A historiadora Wilma Therezinha de Andrade, a irmã Terezinha Cintra, Fábio Zonis, Valentina Leonel Vieira, o bispo e Nazareth, paulatinamente, foram dando forma ao acervo, historiando as peças, buscando sua procedência e fotografando-as para a confecção de um catálogo.

Aparentemente concluído o trabalho, foi convidado a revisá-lo o diretor executivo do Museu de Arte de São Paulo - MASP -, João Marino. O trabalho de reconhecimento, diz Nazareth, não foi fácil, e coube a Marino, profundo conhecedor da arte sacra brasileira, retificar algumas conclusões da comissão. Foi assim que ele descobriu que uma imagem venerada desde o século XVIII, como sendo de Santo Amaro, é na verdade uma imagem de São Bento.

O levantamento comprovou que grande parte das peças são paulistas, principalmente as imagens de barro e madeira. As mais antigas delas são a imagem da Imaculada Conceição, produzida antes de 1660 e de autor desconhecido, e uma imagem de barro cozido representando Santa Luzia, feita também antes de 1661 pelo Frei Agostinho de Jesus.

A relação de peças preciosas do acervo é grande, mas algumas merecem destaque, como dois óleos representando a Anunciação e a Visitação, realizados no século XVIII pelo pintor paulista Silva Manso; a imagem em madeira de Nossa Senhora da Boa Morte, confeccionada no século XVII; o Jesus Morto, também em madeira e em tamanho natural, realizado no século XIX, além de cálices, relógios de sol, ostensórios, candelabros, estandartes e báculos, do século passado (N.E.: século XIX). O museu mostrará, também, o primeiro sacrário da Catedral, construído no início deste século (N.E.: século XX).

O acervo será distribuído em algumas salas e salões do terceiro andar do Mosteiro, em vitrinas e mesas que estão sendo confeccionadas para a exposição. Uma cela será reservada para sediar exposições temporárias - "sempre que possível relacionadas à arte sacra", diz Nazareth -, uma será destinada a receber objetos de uso pessoal e de culto dos bispos que passaram pela Diocese, e outra, reservada desde 1903, será dedicada a Frei Gaspar da Madre de Deus.


Em barro, a Santa Luzia do século XVII
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Cupins no altar - A capela do Mosteiro, provavelmente mais antiga do que o próprio prédio que a cerca, é, por si só, um impressionante legado histórico. A falta de conservação, porém, quase decretou o fim de um de seus altares, confeccionado em cedro pelo Frei Jesuíno do Monte Carmelo, em 1817. Todo entalhado, colocado entre os mais belos representantes do entalhe barroco brasileiro, o altar quase caiu, há alguns anos, atacado pelos cupins.

A invasão dos insetos foi constatada em tempo, e hoje ele está livre daqueles indesejáveis hóspedes. Mas a ação do tempo não pode ser evitada, e ele está atacando, além do altar principal, os patamares do coro e dos balcões de madeira esculpida. A falta de verbas oficiais determinou que as obras de restauração da capela só tenham início após a inauguração do museu. "A restauração deverá ser executada pela Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - SPHAN -, e exigirá a presença de uma ótima equipe de restauradores, arquitetos, especialistas em entalhes e ouro e pedreiros", conta Nazareth. Ela não sabe dizer, porém, quando ou com que verba essa restauração será realizada.

A capela, como era costume antigamente, serve de túmulo para duas figuras importantes da história santista: Frei Gaspar da Madre de Deus e Frei Manoel de Santa Gertrudes Lustosa, este sepultado em 1754, quando faleceu, atacado de febre amarela. Os dois túmulos estão marcados com placas de pedra gravadas pelos beneditinos.

Sem verbas - Tombado pelo SPHAN e o Condephaat, o Mosteiro de São Bento está sem verbas. Para a instalação do museu, seriam necessários Cr$ 6 milhões, dos quais a Secretaria da Cultura do Estado liberou apenas Cr$ 2,8 milhões. Mas esse dinheiro ainda não chegou à Cúria: está retido na Prefeitura, até que a Câmara Municipal aprove sua tramitação oficial. O dinheiro, portanto, é um dos principais motivos de preocupação da comissão.

Por causa dele, a única forma encontrada para manter o museu aberto foi instituir a cobrança de ingresso, procedimento normal no exterior, mas pouco aceito no Brasil. "Se há despesa, e o museu é para o povo, nada mais justo que ele pague para mantê-lo aberto. Esse é um dever cívico", salienta Nazareth.

Talvez como forma de minimizar o impacto dos ingressos, a comissão quer transformar o museu em um instrumento didático de formação cultural, de auxílio à educação. O povo, segundo Nazareth, não tem culpa por não estar consciente do que significa para uma comunidade um museu, e precisa ser educado nesse sentido. Por isso, ele vai às escolas e ao povo, para forçar a retribuição à visita aos tesouros de São Bento.

Somente após alguns meses de funcionamento é que será criado um regimento definitivo para mantê-lo. Nazareth Mota Leite, já se sabe, será sua diretora. E em seu conselho deliberativo figurarão nomes como os de Pietro Maria Bardi, diretor do MASP; Padre Godinho, diretor do Museu de Arte Sacra de São Paulo e João Marino, em homenagem àqueles que tornaram sua instalação viável, apesar de tudo.


Jesus morto, imagem em tamanho natural do século XIX
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Touros, vacas e gentios faziam parte da doação

"E assim mais lhe largarão doze vacas com seu touro nos ditos pastos, com seu pastor por nome Inácio do gentio da terra e que lhe emprestarão uma negra lavadeira do gentio da terra até lhe dar outra para seu serviço e que hum negro que possue, pedreiro por nome Domingos, lhe dariam para fazer as obras necessárias do convento e Igreja".

O texto acima reproduz parte da escritura de doação feita por D. Isabel Barbosa e seu filho Antônio Fernandes Mourão aos beneditinos, de suas propriedades existentes nos Pelames, onde hoje se situa grande parte do Morro do São Bento. O documento foi compilado por Afonso de E. Taunay, em História Antiga da Abadia de São Paulo (1598-1722), editada em 1927.

Quando a escritura foi passada, em janeiro de 1650, a doadora exigia apenas, dos beneditinos que se instalavam na Villa de Santos, que lhe fossem rezadas missas na capela que existia no local. A posse ocorreu, de fato, a 4 de fevereiro daquele ano, quando os religiosos Plácido da Cruz e Basílio da Ascensão realizaram, na pequena capela, a festa de Nossa Senhora do Desterro, a quem o templo era dedicado.

O Mosteiro do São Bento só teve sua construção iniciada em 1725, sofrendo, a partir de então, inúmeras reformas, que acabaram por modificar a antiga estrutura. O autor do projeto e da construção do mosteiro foi o abade Frei Gregório de Magalhães, e sua função não era exatamente a de mosteiro, mas de hospício, ou seja, hospedaria para os monges em trânsito entre o litoral e o planalto.


N. S. do Pilar e o Menino, século XVIII
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Aspiração antiga - Dos portões do Mosteiro de São Bento partiram os caminhos que, em direção ao alto do morro, permitiram que ali se instalassem os primeiros moradores do que hoje se convencionou chamar de Cidade Alta. O morro, no início de sua ocupação, era preferido por pescadores, doqueiros, estivadores e malandros. Por essa época, só subiam o velho Caminho do Wright ou do Ferramenta os que fossem conhecidos. A própria polícia não se atrevia a ir além do portão do Mosteiro.

Em 332 anos de vida, o conhecido mosteiro viu passar, por suas celas e claustros, figuras importantes para a cultura nacional. Em uma de suas celas, Frei Gaspar da Madre de Deus viveu vários anos, meditando e escrevendo algumas de suas mais importantes obras. Seus ossos estão sepultados defronte do altar principal da capela, e em sua antiga cela, uma placa colocada pela Câmara Municipal, em 1903, evoca sua presença. Nela pretende-se recolocar o mobiliário utilizado por Frei Gaspar, e alguns manuscritos e documentos que lhe pertenciam.

A importância histórica do mosteiro foi reconhecida em 1968, quando o Departamento de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - hoje Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN) - assinou, com a Cúria Diocesana, o convênio para o tombamento e abriu a possibilidade de restauração e criação do Museu de Arte Sacra de Santos.

A infeliz rotina das promessas não cumpridas, entretanto, prorrogou a esperada criação do museu por 13 anos. Em 1969, o professor Luiz Saya, diretor do 4º Distrito do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, afirmava que o museu estaria instalado até o fim daquele ano, contendo imagens, móveis, livros, alfaias e objetos de culto. As verbas destinadas para a restauração acabaram sendo insuficientes, e em 1974 o mesmo professor Luiz Saya concedia entrevista a A Tribuna, dizendo que "até 26 de janeiro do próximo ano o Museu de Arte Sacra será entregue, como presente para Santos".

A promessa, obviamente, foi outra vez esquecida, e as obras de restauração do prédio foram sendo feitas lentamente. Apenas este ano a Cúria Diocesana, a quem o mosteiro efetivamente pertence, declarou que o Museu de Arte Sacra será definitivamente inaugurado. A data já está marcada para 21 de novembro e, desta vez, o próprio secretário Cunha Bueno, da pasta estadual da Cultura, avalizou a promessa.


Santa Mônica em madeira, do século XIX
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Em 1998, em página Web, a Prefeitura Municipal de Santos incluía informações complementares sobre o museu:

O interior do museu
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Em 1650, o Morro do São Bento era chamado de Morro de Nossa Senhora do Desterro. No mesmo ano, o edifício onde está hoje o Museu de Arte Sacra de Santos (Mass, Rua Santa Joana D’Arc, 795, Morro do São Bento/Valongo) era o Mosteiro de Nossa Senhora do Desterro da Ordem de São Bento. O mosteiro foi construído pelos freis beneditinos em forma de forte para evitar ataques de piratas. O prédio foi erguido com areia, pedra, sambaqui (restos de ostras e mariscos) e óleo de baleia e possui paredes até com 90 centímetros de espessura.

Ao visitar o Museu de Arte Sacra é possível conhecer as instalações dos frades que viviam enclausurados, ou seja, longe da sociedade: celas (quartos), sala de refeição, sala de estudo e o claustro (jardim interno que possibilitava o único contato dos internos com o mundo lá fora). É também neste importante patrimônio histórico e cultural de Santos que podemos ter acesso a obras sacras e religiosas dos séculos 16 a 19, peças e documentos. Impossível deixar de ver uma das peças mais antigas do acervo do Museu de Arte Sacra: a imagem de Santa Catarina de Alexandrina, de 1540. O objeto pertenceu à primeira capela de Santos, a do Outeiro de Santa Catarina, e foi encontrado depois de ficar 80 anos perdido no mar.

Entre as instalações do museu destacam-se a Sala das Pratarias, Sala dos Bispos, Sala Beneditina (antiga Sala de Frei Gaspar), Sala de Crucifixos e Imagens Pequenas, Sala de Arte Religiosa Popular, Sala das Máscaras, Igreja Nossa Senhora do Desterro e Biblioteca.

 

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