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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - AUTONOMIA
20 anos depois

Foi a mais importante solenidade vivida pela Cidade nos últimos tempos
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Texto publicado no jornal santista A Tribuna em 9 de julho de 2004:
 


EMOÇÃO - Povo festeja na Praça Mauá
Foto: Arquivo, publicada com a matéria

Cidade comemora 20 anos de autonomia

No dia 9 de julho de 9184, após um longo período de exceção, Santos recuperou a sua autonomia política e administrativa. Coube a Oswaldo Justo o privilégio de ser o primeiro prefeito eleito pelo voto popular após o restabelecimento da democracia.


A partir da esquerda, Arthur Rivau, Agostinho Proença, Justo, 
Écio Lescreck, Paulo de Assis e Esmeraldinho
Foto: Arquivo, publicada com a matéria

HISTÓRIA
Santos completa 20 anos da autonomia

Em uma manhã festiva de 9 de julho, Oswaldo Justo tomou posse

Reynaldo Salgado
Subeditor Local

O dia amanheceu ensolarado em Santos naquela festiva manhã de segunda-feira, 9 de julho de 1984, há exatamente 20 anos. Para o povo paulista, o dia tinha um significado histórico: relembrava o 52º aniversário da heróica Revolução Constitucionalista de 1932.

Para o povo santista, o 9 de julho passaria a ter mais um significado especial a partir daquele dia. O clima era de festa naquela manhã porque, depois de um longo período de exceção (foram 15 anos), Santos iria recuperar efetivamente a sua autonomia política e administrativa.

O privilégio de ficar na história do Município como o primeiro chefe do Poder Executivo eleito pelo voto popular, após a autonomia ser restabelecida, foi de Oswaldo Justo, aos 57 anos de idade.

Às 11h08, o então presidente da Câmara, vereador Noé de Carvalho (PMDB, o mesmo partido de Justo) declarou oficialmente retomada a autonomia santista, logo depois de dar posse ao companheiro de partido.

Os aplausos começaram na Sala Princesa Isabel e ecoaram pelos corredores do Palácio José Bonifácio e pela Praça Mauá, tomada por uma multidão de anônimos, que não queriam perder a oportunidade de testemunhar aquele momento histórico.

Quem compareceu não se arrependeu, pois foi considerada "a mais importante solenidade vivida pela Cidade nos últimos tempos", conforme noticiou A Tribuna na edição do dia seguinte à posse.

Desabafo

"Não temos vocação para o cativeiro. Somos livres"

Oswaldo Justo
Prefeito empossado

Liberdade - Com o aval de 78.413 votos, Justo não quis se arriscar na hora do discurso mais esperado, que levaria 18 minutos para ser lido. Um amigo confidenciou que ele não queria ser traído pela emoção. Apesar de possuir o dom da oratória, abriu mão do improviso e partiu para a leitura do texto que tinha preparado.

"Não temos vocação para o cativeiro. Somos livres e esse estado de alma o nosso povo sempre proclamou, sustentando sua soberania", disse o prefeito em voz alta, antes de relembrar a tradição da Cidade: "Daqui partiram todos os movimentos de libertação. Mantivemos a chama dos irmãos Andradas e a sublime solidariedade dos homens do Quilombo".

Depois do desabafo, que serviu para retirar o nó entalado na garganta durante uma década e meia, a renovação do compromisso de campanha: "Não vou prometer nenhuma obra, mas posso garantir que não faltará empenho da minha equipe durante o mandato que estamos começando. O governo deve ser subordinado ao povo. E não o povo subordinado ao governo".

Solidariedade - Naturalista, faixa preta e professor de caratê, além de adepto ferrenho do zen-budismo, Justo já tinha se destacado no meio político santista. Além de ter exercido mandatos como vereador, ele tinha sido o vice de Esmeraldo Tarquínio, prefeito eleito que teve seu mandato cassado em 1969, pouco antes de tomar posse.

Em solidariedade ao companheiro, Justo preferiu não assumir o posto que, por justiça e direito, teria que ser ocupado por Tarquínio. Depois disso, a autonomia também foi cassada e o regime militar, que comandava o País, rotulou Santos de "área de segurança nacional".

O decreto federal, datado de 12 de setembro de 69, tirou do santista a competência de escolher seu prefeito. O cargo passou a ser da confiança exclusiva do governador do Estado, que nomeava quem ele desejasse, após prévia consulta e aprovação do general que estivesse na Presidência da República.

Esmeraldo Tarquínio já tinha morrido (em novembro de 1982), mas seu filho, Esmeraldo Tarquínio Neto, fez dobradinha com Justo, na eleição de 3 de junho de 1984, e também participou da festa realizada há 20 anos.

O discurso do vice seguiu na mesma linha e acrescentou que o povo paulista tinha idêntica tradição: "Na Revolução Constitucionalista de 32, que também estamos comemorando, os paulistas demonstraram as mesmas aspirações de liberdade e de justiça".

Entretanto, a parte que mais emocionou o público foi quando Esmeraldinho falou de seu pai: "Cassaram Esmeraldo Tarquínio. Cassaram a liberdade de nossa terra. Mas não cassaram a dignidade de nosso povo. Não cassaram a nossa esperança, a nossa fé, os nossos ideais".

Secretariado de Oswaldo Justo

Assuntos Jurídicos - Écio Lescreck
Finanças - Arthur Rivau
Obras e Serviços Públicos - Luís Alberto Maia
Educação e cultura - Alípio Labão
Higiene e Saúde - Paulo Ricardo de Assis
Turismo e Esportes - Álvaro Bandarra
Administração - Agostinho Proença

 

Governador Franco Montoro não participou da solenidade

Quase na mesma proporção do clima festivo, também havia na Cidade uma revolta generalizada contra o governador na época, Franco Montoro (PMDB), em virtude de um aumento considerado abusivo (índice de quase 200%) da tarifa do pedágio no Sistema Anchieta/Imigrantes (SAI), autorizado por ele.

Entidades representativas do comércio, da comunidade e dos trabalhadores colocaram faixas de protesto em pontos estratégicos, desde a entrada da Cidade, para demonstrar indignação com o reajuste. Entretanto, para frustração dos manifestantes, Montoro não veio. Foi representado por seu vice, Orestes Quércia, que mais tarde iria sucedê-lo no cargo.

Breve em seu discurso, Quércia comparou a situação de Santos com a do País, que na época vivia o auge da campanha pelas diretas-já. Era um movimento cada vez mais contagiante e que exigia o fim da ditadura militar, implantada com o golpe de 31 de março de 1964.

O povo queria a liberdade de poder voltar a eleger o presidente da República. "Sem dúvida, o que acontece em Santos é um passo decisivo na vocação libertária de nosso povo. Considero uma honra estar presente nesta solenidade, nascida do espírito de luta do extraordinário povo santista", disse Quércia.

Quem também participou da sessão solene na Câmara foi Mário Covas, que na época exercia o cargo de prefeito nomeado de São Paulo, por indicação de Montoro. As capitais dos estados brasileiros também eram rotuladas como áreas de interesse da segurança nacional pela ditadura militar. Por conta disso, seus moradores não podiam eleger o prefeito.

1.800 convites

foram expedidos, mas havia mais de duas mil pessoas 
dentro do Palácio José Bonifácio

 

De Bagdá - Um dos fatos pitorescos da cerimônia foi a leitura, por Noé de Carvalho, de um telex vindo de Bagdá, capital do Iraque, que hoje sofre as conseqüências da intervenção militar dos Estados Unidos. O remetente era Gastone Righi, deputado federal na época e autor do projeto (que não chegou a ser votado no Congresso) para restabelecer a autonomia.

Além de justificar a ausência, o objetivo da mensagem era saudar Justo: "Aqui em Bagdá, sua posse torna possível o sonho das mil e uma noites".

Para a cerimônia em que Oswaldo Justo (falecido em 14 de abril do ano passado) assumiu a administração foram expedidos 1.800 convites, distribuídos da seguinte maneira: mil para convidados da Prefeitura, 300 da Câmara e 500 do principal personagem do evento (o prefeito eleito).

Entretanto, mais de duas mil pessoas conseguiram entrar no Paço Municipal para asisstir a posse (realizada na Câmara) e a transmissão do cargo (no Salão Nobre da Prefeitura, que mais tarde iria ser denominado Esmeraldo Tarquínio).

Homenagem - Em 2 de agosto de 1984, quando o decreto da autonomia completou um ano, a Câmara reconheceu o trabalho da Imprensa e entregou uma placa em homenagem a A Tribuna. Iniciativa do então vereador Moacir de Oliveira, que definiu o apoio do jornal como "um dos exemplos mais nobres da função da Imprensa".


Adelino não viu nada parecido/Constantino destacou liberdade/Mantovani enfatizou objetivos
Fotos: Arquivo, publicadas com a matéria

Dos 19 vereadores, 11 pertenciam ao PMDB de Justo

O PMDB contava com uma maioria tranqüila na Câmara quando a autonomia foi de fato restabelecida. Do total de 19 vereadores (posteriormente aumentado para 21), onze eram peemedebistas. O PDS (hoje PP) ocupava quatro cadeiras: o PT duas e o PTB também duas.

Dos 19, três permanecem na Câmara até hoje: Adelino Rodrigues (PSB), Manoel Constantino (PMDB) e Mantovani Calejon (PTB)

Adelino, que na época estava no primeiro mandato de vereador, guarda tudo na lembrança e abre um largo sorriso quando é indagado a respeito do assunto. "Aquilo foi emocionante e não dá para esquecer. Não vi até agora, em 21 anos como vereador, coisa mais gratificante. Foi um movimento popular e que contagiou toda a Cidade, praticamente na mesma proporção do que iria acontecer mais tarde no País, quando o povo brasileiro reconquistou o direito de votar para presidente da República".

"A cassação da autonomia de nossa Cidade foi um duro e imerecido golpe, que privou o santista do direito primordial de qualquer regime democrático: o voto popular. Por isso, considero que 9 de julho de 1984 foi o dia em que o povo recuperou sua liberdade, sua cidadania", enaltece Constantino ao relembrar a data.

"Foi um movimento que teve princípio, meio e fim. Aliás, o único fato com essas três características que eu presenciei até hoje, em 30 anos de vida pública. A luta foi longa e árdua, mas, no final, alcançamos nosso objetivo", define Mantovani.

Os três vereadores também fazem questão de destacar outro fato que não saiu da lembrança: o dia 3 de agosto de 1983, quando a caravana denominada Leonardo Roitman (líder sindical) voltou de Brasília, no dia seguinte à assinatura do decreto da autonomia, e foi recebida com uma grande festa.

O título da matéria de A Tribuna sobre o retorno da comitiva, que tinha viajado para pressionar os deputados a votarem a devolução da liberdade ao povo santista, deu uma idéia do clima: Uma loucura na Praça Mauá, pela autonomia.

Paradoxos - Se por um lado o PMDB de Santos teve motivos de sobra para estar em festa naquele 9 de Julho, o diretório do mesmo partido, em Cubatão, era forçado a passar por um momento constrangedor, em se tratando de uma legenda que batalhou (desde que era o MDB) por eleições diretas.

Alguns dias antes da posse em Santos, o PMDB de Cubatão preparava uma lista com sete nomes, que seria encaminhada ao governador Montoro, para que ele escolhesse o novo prefeito da cidade. Por causa da Refinaria Presidente Bernardes, Cubatão permanecia incluída na relação das áreas de segurança.

Posteriormente, pouco mais de uma semana depois de Justo assumir, o povo santista levou um susto com a manchete divulgada pelos meios de comunicação: Nova ameaça de intervenção em Santos.

O pedido de intervenção era constitucional e teve a iniciativa do Poder Judiciário, por causa de processos de expropriações de imóveis que não tinham sido pagas pela Prefeitura. Justo teve que correr para negociar o parcelamento e repetiu uma frase dita antes de tomar posse: "Estou assumindo uma massa falida de 15 anos".

Câmara em 84

Adelino Rodrigues (PMDB)
 Alcindo Gonçalves (PMDB)
  Edmur Mesquita (PMDB)
   Eduardo Castilho Salvador (PMDB)
    Fernando Oliva (PDS)
     Geraldo Silvino (PMDB)
      Gilberto Tayfour (PTB)
       Manoel Constantino (PMDB)
        Mantovani Calejon (PDS)
         Matsutaro Uehara (PDS)
          Moacir de Oliveira (PMDB)
           Nobel Soares (PT)
            Noé de Carvalho (PMDB)
             Odair Viegas (PDS)
              Oswaldo Carvalho De Rosis (PTB)
               Reinaldo Cammarosano (PMDB)
                Rivaldo Justo (PMDB)
                 Roberto Bonavides (PMDB)
                  Telma de Souza (PT)

 

Último nomeado pelo regime estabeleceu uma condição

Barbosa também comemorou
Foto: Arquivo, publicada com a matéria

Último prefeito nomeado da Cidade, Paulo Gomes Barbosa, que hoje é vereador (cumpre o segundo mandato) pelo PSDB, transmitiu o cargo para Oswaldo Justo.

Hoje, ele repete o que disse em inúmeras entrevistas após a devolução da autonomia: "Quando fui chamado em Brasília, para ser comunicado oficialmente de minha indicação, eu estabeleci uma condição: aceitaria se fosse o último nomeado, ou seja, ficaria também com a missão de passar o cargo para um prefeito eleito pelo povo de Santos, fato que realmente se concretizaria".

Por causa disso, Barbosa também se sentiu realizado e feliz naquele 9 de julho: "A alegria foi tanta que, depois da cerimônia, eu e minha equipe de secretários fomos almoçar juntos para comemorar um feito marcante em nossas vidas e na história de Santos".

Contagem - Justo iria permanecer no cargo durante quase 4 anos e meio (o mandato terminou em 31 de dezembro de 1988). Para não perder de vista o tempo que tinha para administrar a Cidade ele não teve dúvidas: todo dia, ao chegar em seu gabinete, renovava o bilhete deixado sobre a mesa com um recado para si próprio, informando quanto faltava para completar o mandato.

Foi uma contagem regressiva, iniciada naquele dia, quando deixou o primeiro bilhete: "Faltam 4 anos, 5 meses e 22 dias".

Ao contrário dos prefeitos eleitos de outras cidades brasileiras, que foram privilegiados com um mandato de seis anos (1983/1988), por conta de uma das muitas medidas casuísticas do regime de exceção, Justo ficaria menos tempo no cargo.

Em busca de uma compensação, ele encontrou a fórmula que ampliaria seu tempo real como administrador: criou as famosas reuniões da madrugada no salão nobre, determinando que o expediente dele e dos secretários começasse às 6 horas.

A Tribuna não esquece


Foto: Arquivo, publicada com a matéria

Dia 9 de julho de 1984

A manchete da primeira página enfatizou que naquele dia a autonomia de Santos seria efetivamente restabelecida, com a posse de Oswaldo Justo como prefeito. Desde que a Cidade foi declarada de interesse da segurança nacional (por causa do porto) e até que Justo assumisse, um general (Clóvis Bandeira Brasil, como interventor) e três civis (Antônio Manoel de Carvalho, Carlos Caldeira Filho e Paulo Gomes Barbosa, como prefeitos nomeados) ocuparam a principal cadeira do Palácio José Bonifácio.

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