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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - SANTOS EM 1587 - BIBLIOTECA NM
1587 - Notícia do Brasil - [II - 158]

Clique na imagem para voltar ao índice desta obraEscrita em 1587 pelo colono Gabriel Soares de Souza, essa obra chegou ao eminente historiador Francisco Adolpho de Varnhagen por cópias que confrontou em 1851, para tentar restabelecer o texto original desaparecido, como cita na introdução de seus estudos e comentários. Em 1974, foi editada com o mesmo nome original, Notícia do Brasil, com extensas notas de importantes pesquisadores. Mais recentemente, o site Domínio Público apresentou uma versão da obra, com algumas falhas de digitalização e reconhecimento ótico de caracteres (OCR).

Por isso, Novo Milênio fez um cotejo daquela versão digital com a de 1974 e com o exemplar cedido em maio de 2010 para digitalização, pela Biblioteca Pública Alberto Sousa, de Santos, através da bibliotecária Bettina Maura Nogueira de Sá. Este exemplar corresponde à terceira edição (Companhia Editora Nacional, 1938, volume 117 da série 5ª da Brasiliana - Biblioteca Pedagógica Brasileira), com os comentários de Varnhagen. Foi feita ainda alguma atualização ortográfica:

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Tratado descritivo do Brasil em 1587

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Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa

SEGUNDA PARTE - MEMORIAL E DECLARAÇÃO DAS GRANDEZAS DA BAHIA

TÍTULO 17 — Noticia etnográfica do gentio tupinambá que povoava a Bahia

Capítulo CLVIII

Que trata do modo de comer e do beber dos tupinambás.

Já fica dito como os principais dos tupinambás quando comem, estão deitados na rede, e como comem com eles os parentes, e os agasalha consigo; entre os quais comem também os seus criados e escravos, sem lhe terem nenhum respeito; antes quando o peixe ou carne não é que sobeje, o principal o reparte por quinhões iguais, e muitas vezes fica ele sem nada, os quais estão todos em cócoras, com a vasilha em que comem todos no chão no meio deles, e enquanto comem não bebem vinho, nem água, o que fazem depois de comer.

Quando os tupinambás comem à noite, é no chão como está dito, e virados com as costas para o fogo, e ficam todos às escuras; e não praticam em coisa alguma quando comem, senão depois de comer; e quando têm quê, toda a noite não fazem outra coisa, até que os vence o sono; e por outra parte mantém-se este gentio com nada, e anda logo dois e três dias sem comer, pelo que os que são escravos dão pouco trabalho a seus senhores pelo mantimento, antes eles mantêm os senhores fazendo-lhes suas roças, e caçando, e pescando-lhes ordinariamente.

Este gentio não come carne de porco, dos que se criam em casa, senão os escravos criados entre os brancos; mas comem a carne dos porcos-do-mato e da água; os quais também não comem azeite, senão os ladinos; toda a caça que este gentio come, não a esfola, e chamuscam-na toda ou pelam-na na água quente, a qual comem assada ou cozida e as tripas mal lavadas; ao peixe não escamam nem lhe tiram as tripas, e assim como vem do mar ou dos rios, assim o cozem ou assam: o sal de que usam, com que temperam o seu comer, e em que molham o peixe e carne fazem-no da água salgada que cozem tanto em uma vasilha sobre o fogo, até que se coalha e endurece, com o que se remedeiam; mas é sobre o preto, e requeima.

Este gentio é muito amigo do vinho, assim machos como fêmeas, o qual fazem de todos os seus legumes, até da farinha que comem; mas o seu vinho principal é de uma raiz a que chamam aipim, que se coze, e depois pisam-na e tornam-na a cozer, e como é bem cozida, buscam as mais formosas moças da aldeia para espremer estes aipins com as mãos e algum mastigado com a boca, e depois espremido na vasilha, que é o que dizem que lhe põem a virtude, segundo a sua gentilidade; a esta água e sumo destas raízes lançam em grandes potes, que para isso têm, onde este vinho se coze, e está até que se faz azedo; e como o está bem, o bebem com grandes cantares, e cantam e bailam toda uma noite às vésperas do vinho, e ao outro dia pela manhã começam a beber, bailar e cantar; e as moças solteiras da casa andam dando o vinho em uns meios cabaços, a que chamam cuias, aos que andam cantando, os quais não comem nada enquanto bebem, o que fazem de maneira que vêm a cair de bêbados por esse chão; e o que faz mais desatinos nessas bebedices, esse é o mais estimado dos outros, nos quais se fazem sempre brigas; porque aqui se lembram de seus ciúmes, e castigam por isso as mulheres, ao que acodem os amigos, e jogam às tiçoadas uns com os outros.

São costumados a almoçar primeiro que se vão às suas roças a trabalhar, onde não comem enquanto andam no trabalho, senão depois que se vêm para casa.