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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - SANTOS EM 1913 - BIBLIOTECA NM
Impressões do Brazil no Seculo Vinte - [15]

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Clique nesta imagem para ir ao índice da obraAo longo dos séculos, as povoações se transformam, vão se adaptando às novas condições e necessidades de vida, perdem e ganham características, crescem ou ficam estagnadas conforme as mudanças econômicas, políticas, culturais, sociais. Artistas, fotógrafos e pesquisadores captam instantes da vida, que ajudam a entender como ela era então.

Um volume precioso para se avaliar as condições do Brasil às vésperas da Primeira Guerra Mundial é a publicação Impressões do Brazil no Seculo Vinte, editada em 1913 e impressa na Inglaterra por Lloyd's Greater Britain Publishing Company, Ltd., com 1.080 páginas, mantida no Arquivo Histórico de Cubatão/SP. A obra teve como diretor principal Reginald Lloyd, participando os editores ingleses W. Feldwick (Londres) e L. T. Delaney (Rio de Janeiro); o editor brasileiro Joaquim Eulalio e o historiador londrino Arnold Wright. Ricamente ilustrado (embora não identificando os autores das imagens), o trabalho informa, nas páginas 148 a 152, a seguir reproduzidas (ortografia atualizada nesta transcrição):

Impressões do Brazil no Seculo Vinte


Pintores e escultores brasileiros: 1) Antonio Parreiras; 2) Rodolpho Amoedo; 3) Georgina de Albuquerque; 4) Lucilio de Albuquerque; 5) Corrêa Lima; 6) Aurelio Figueiredo; 7) Elyseu Visconti
Foto publicada com o texto, página 149

Pintura e escultura

Por Carlos Américo dos Santos,

Crítico de arte

s belas-artes no Brasil mereceram a atenção oficial desde 1816, quando d. João VI, de Portugal, retirando-se de Lisboa, em 1808, em conseqüência da invasão do país pelos franceses e, vindo para o Rio de Janeiro, aí fundou a Academia das Belas-Artes.

Antes, porém, dessa época, se haviam já manifestado aptidões artísticas, tanto na Bahia como no Rio, e ainda em alguns outros pontos do interior e nas províncias do Norte. Assim o provam as pinturas, obras de talha e trabalhos em relevo sobre madeira, que se encontram nas igrejas e conventos antigos.

O primeiro pintor de que há notícia no Brasil, e cujo nome passou realmente à posteridade, foi o frade beneditino Ricardo do Pilar, um flamengo que veio para o Rio em 1695 e morreu em 1700, mais ou menos. O único trabalho ainda existente, dos muitos por ele executados, é um grande quadro do Salvador envolto na túnica e levantando aos céus as mãos atravessadas pelos cravos que o prenderam à cruz. Esta pintura, que é muito boa, considerando-se a época em que foi executada, pode ainda ser admirada no altar-mor da igreja do convento dos beneditinos no Rio.

Depois do frade Ricardo do Pilar, há notícia do pintor José de Oliveira, nascido no Rio depois de 1700 e que decerto estudou em Portugal. Este artista fez a decoração do salão principal do antigo Palácio dos Vice-Reis, duma sala no Forte da Conceição, da capela mor da atual Catedral, do teto e das colunas do altar da igreja de S. Francisco da Penitência.

Outros pintores desse mesmo período foram: Francisco Muzzi; João de Souza, autor, duma Virgem existente no Convento dos Carmelitas do Rio; Manoel da Cunha, mulato, e discípulo do precedente, que fez a decoração de algumas das igrejas do Rio e executou vários retratos; Leandro Joaquim; o frade Francisco Solano; Raymundo da Costa e Silva, também mulato; Manoel Dias de Oliveira Braziliense; Antonio Alves; José Leandro de Carvalho; Domiciano Pereira Barreto e José Vidal.

Todos estes artistas se dedicavam à pintura mural e decoravam o interior das igrejas e das principais casas no Rio. O melhor deles foi José Leandro, que nos deixou vários retratos do rei d. João Vi e de várias personagens importantes da época, feitos com um grande realismo.

Para fundar a Academia das Belas-Artes, contratou o rei d. João meia dúzia de artistas, entre os quais os célebres pintores Nicolas Antoine Taunay e Jean Débret. Estes artistas deixaram no Brasil diversos trabalhos de valor, que figuram na Galeria Nacional das Belas-Artes no Rio de Janeiro.

Outros artistas do mesmo período foram: Simplício de Sá e Henrique José da Silva, cujo nome consta do Diccionario de Bryan; Emilio Taunay, filho de Nicolas Taunay, professor de paisagem e mais tarde diretor da Academia do Rio, que foi o primeiro a pintar a natureza brasileira; Corrêa de Lima, falecido em 1857, bom pintor de quadros históricos; Claudio Barandier, falecido em 1867, notável pintor de retratos; Manoel de Araujo Porto Alegre (1806-1876), que se distinguiu como arquiteto, pintor e escritor.

Este último começou a vida como aprendiz de relojoeiro em Porto Alegre, capital da então Província do RIo Grande do Sul. Graças ao talento que revelou, foi enviado para o Rio, onde se matriculou na Academia de Belas-Artes. Dentro de pouco tempo mostrava tais progressos, que foi chamado para pintar o retrato do imperador d. Pedro I e este gostou tanto da obra que formou a intenção de mandar o artista estudar na Europa. Não pôde, porém, o imperador pôr em prática tal projeto, porque pouco depois era forçado a abdicar.

Devido, entretanto, à generosidade de dois amigos seus, pôde Manoel de Araujo Porto Alegre ir à Europa em 1831, e aí se demorou até 1837, viajando à França, Inglaterra, Bélgica, Holanda e Itália. Foi mais tarde professor de pintura histórica e depois nomeado diretor da Academia e feito barão de Santo Angelo.

Fisicamente, era um belo homem, alto e robusto; e moralmente, homem de grande retidão de caráter. Conquanto não fosse um gênio, Porto Alegre pode ser colocado a par dos melhores dos seus conterrâneos.

Os outros artistas desse período são: Joaquim Lopes de Barros Cabral Teive, falecido em 1860, professor da Academia do Rio; Mendes Carvalho, pintor de retratos; Mello Côrte Real, que morreu moço e deixou algumas pinturas históricas de valor; Maximiano Mafra, que se distinguiu como pintor de retratos; Antonio  Nery, falecido em 1886, colorista notável; Grand-Jean Ferreira, impecável no desenho, que pintou assuntos bíblicos; Poluceno da Silva Manoel, pintor de retratos; Agostinho José da Motta, falecido em 1878, excelente paisagista e pintor de retratos que estudou na Itália e deixou também bons trabalhos de natureza morta; Arsenio da Silva (1881), que foi um miniaturista de valor e deixou bons trabalhos de cenário brasileiro, de colorido delicado e rico e de ótimo desenho.

Pedro Americo de Figueiredo e Mello é o primeiro artista brasileiro realmente grande. Nasceu em Areias, estado da Paraíba, em 1843, e estudou na Academia do Rio e em Paris no ateliê de Leon Coquiet, onde foi colega de Bonnat, Jean Paul Laurens, J. Lefebvre, Mile Jacquemart, Gide e outros estudantes, que mais tarde ocuparam lugares eminentes na carreira artística.

Pedro Americo de Figueiredo, voltando ao Brasil, teve ensejo de pintar vários grandes quadros de batalhas, que comemoram alguns dos mais importantes episódios da história do país e pelo valor desses trabalhos conquistou grande renome entre os seus patrícios. As suas predileções eram, entretanto, para os assuntos religiosos, bíblicos e alegóricos; e a sua reputação futura há de se basear nas obras deste gênero. David, Judith, a Mater Dolorosa, Jacob, Heloisa, são alguns dos temas de que Pedro Americo tratou em suas telas, notáveis pela expressão característica e pelo colorido suntuoso.

Victor Meirelles de Lima (falecido em 1904), filho do estado de Santa Catarina, depois de cursar a Academia de Belas-Artes, foi para Roma, onde estudou com Minardi e Nicolas Cousoni, que dele fez um desenhista admirável. Depois, esteve em Paris, onde estudou com Paul Delaroche. Como Pedro Americo, foi também professor da Academia de Belas-Artes do Rio de Janeiro e, ainda como aquele, pintou quadros de batalhas, que, na época, eram os assuntos que mais rapidamente davam nomeada aos artistas e lhes proporcionavam melhores vantagens pecuniárias.

O seu primeiro e mais importante trabalho, Primeira Missa no Brazil, é uma tela magnífica, cheia de figuras de fidalgos portugueses, frades, soldados, marinheiros e índios, dos dois sexos. A composição é admirável, verdadeiramente natural, e dá ao observador a impressão de que a cena se devia ter dado como está representada na tela. O desenho é muito bom; a distribuição das cores, conquanto sóbria, torna-se atraente e brilhante.

Pintou também Victor Meirelles telas de cor local, todas sobre assuntos brasileiros, e ainda vários retratos e dois panoramas, nos quais demonstrou belas qualidades de paisagista. Foi um artista caprichoso e diligente; o seu desenho era perfeito; a sua perspectiva tinha qualidades notáveis; e todas as suas telas revelam sentimento poético, conquanto um tanto artificial.

José Flemmig de Almeida Junior foi um artista de grande originalidade e aquele que, tanto na paisagem como na pintura de figuras, mostrou mais qualidades caracteristicamente brasileiras. Depois do seu curso na Escola de Belas Artes do Rio, passou cerca de cinco anos em França, onde adquiriu uma técnica delicada e firme, um tanto no gênero de Bastien Lepage. A sua maneira de ver conservou, entretanto, o caráter nacional e individual; e na pintura de tipos de velhos, na interpretação das fisionomias gastas pela idade, às quais dava uma expressão intensa, a sua técnica era um tanto esforçada e minuciosa. Mas essa técnica tomava mais largueza e adquiria mais vigor nas telas em que representou alguns dos tipos característicos e impressionantes dos fortes e ousados pioneiros, que devassaram o território e preparam o futuro brilhante do seu estado natal, São Paulo.

Hoje, a lista dos artistas brasileiros, sobretudo pintores, é relativamente numerosa. Alguns deles, se fossem conhecidos em centros maiores e mais educados para a apreciação da Arte, figurariam, como reputação, entre os melhores doutros países. Quase todos estudaram na Escola de Belas Artes; e depois, estadias mais ou menos prolongadas em Roma, Paris ou Munique contribuíram para aperfeiçoar os seus conhecimentos, e os fizeram voltar ao Brasil preparados para a conquista dos decisivos triunfos.

Infelizmente, a luta em meio tão estreito e tão pouco favorável é, por enquanto, muito dura, e apenas alguns, relativamente poucos, conseguem adquirir proeminência, nomeada e competência reconhecida. Mencionaremos aqueles que atualmente ocupam as primeiras posições e em seguida alguns dos artistas moços ainda, mas já com um futuro francamente prometedor.

Rodolpho Amoedo é um homem ainda no vigor da vida. Foi discípulo de Cabanel, de cujo ateliê saiu com uma técnica perfeita, conhecimentos profundos e uma verdadeira ciência no modelar. As suas telas principais são A Partida de Jacob, A Narrativa de Philetas, Jesus em Capharnaum e a Mulher nua dormindo.

Decio Villares é um desenhista exímio e um colorista de fino idealismo. Pintou várias telas encantadoras. Os seus trabalhos inspiram-se, em geral, em temas das Escrituras, ou então são retratos de formosas senhoras, os quais o artista executa de maneira sempre bela e brilhante. Há também notáveis trabalhos seus em escultura.

Henrique Bernardelli, atualmente no vigor da idade, é um artista variado e vigoroso, de real caráter e sentimento. As suas primeiras telas mostram a influência da escola italiana. Depois disso, porém, tem o pintor manifestado um sentimento artístico moderno e de grande ductilidade. A sua técnica é larga e original; o seu desenho correto, simples e impressionante; e o seu colorido, conquanto o não caracterize uma grande vivacidade, tem qualidades deveras atraentes. O tom geral das suas telas é luminoso.

H. Benardelli trabalha, igualmente bem, em pintura a óleo, aquarela, pastel ou carvão. Dotado de um espírito original e independente, tem executado telas sobre assuntos variados e em todos eles predomina a mesma individualidade, o mesmo espírito refletido e sereno, completamente absorvido em sua arte e indiferente às influências estranhas, revelando grande complacência nos aspectos externos dos indivíduos e das coisas e na excelência do trabalho artístico. Tem cultivado mais a pintura de retratos, e neste ramo da arte obtido êxitos notáveis. É talvez entre nós o único mestre pintor (maitre-peintre), na acepção que a estas duas palavras dão sos artistas franceses.

Belmiro de Almeida é também um bom artista. A sua arte tem um incontestável cunho original. Os assuntos das suas telas são tirados da vida comum, principalmente entre a sociedade culta: Belmiro tem a mesma tendência predominante do pintor belga, que acaba de falecer, Alfred Stevens, pois, como a este, lhe apraz representar as mulheres jovens e belas, em seu meio típico, ao qual dá sempre uma intenção muito viva. Desenhista de primeira ordem, distingue-se também como colorista fino e delicado. A disposição das cores nas suas telas é, em regra, correta, muito harmoniosa e em tons leves. Não se lhe nota um empasto, nem um descuido no modo de colocar as cores.

Belmiro é também um pintor decorativo de valor pouco vulgar e neste ramo de Arte tem produzido painéis importantes, ilustrando episódios da história do Brasil, desenhados com cuidado e pintados com uma grande delicadeza em um tom fino e leve, em extremo harmonioso.

Outro pintor de real valor é Elyseu d'Angelo Visconti, artista fecundo e brilhante, sob diversos aspectos. Visconti está igualmente à vontade em qualquer ramo de sua arte, mas sempre com propensões muito claras para a escola moderna imaginativa decorativa. A sua técnica é segura e brilhante, como se deveria esperar dum artista que trabalhou assiduamente nos ateliês d'alguns dos mais reputados pintores de Paris; o seu espírito acentuadamente poético está impregnado das tendências dos neo-idealistas, originadas nos princípios estabelecidos por Burn-Jones e pelos escritores franceses que, nos últimos anos do século que findou, operaram a reversão do naturalismo ao neo-cristianismo. Isto, quanto às suas produções de ordem imaginativa.

Elyseu Visconti, porém, consagrou muitos dos seus estudos e mesmo as suas preferências à arte aplicada ou decorativa, no sentido que lhe dava William Morris, e foi discípulo da hoje famosa École Guerin e também de Grasset. Ultimamente, dedicou-se à pintura de retratos e neste ramo tem também revelado esplêndidas qualidades, demonstrando quanto o impressionaram e quão profundo estudo lhe mereceram as obras imortais de Velasquez.

Aurelio de Figueiredo é um artista a que podemos chamar intelectual. Um tanto poeta e idealista, não se contenta em reproduzir a natureza como esta se lhe apresenta. Como paisagista, distingue-se pela atmosfera poética, que predomina em todas as suas telas; e como figurista, deleita-se em pintar lindas crianças e moças, em cenários sempre opulentos.

Zeferino da Costa pintou vários quadros bíblicos, tratados com espírito e bom colorido. O seu trabalho principal é, porém, a decoração do teto da maior e mais arquitetônica igreja do Rio de Janeiro, a Candelária, onde mostrou não haver em vão estudado as obras dos pintores italianos do Renascimento.

Castagnetto, já falecido, distinguiu-se como pintor de marinhas, mas só os aspectos pitorescos e bonançosos do mar atraíam a sua fantasia. Deleitava-se em pintar barcos de pesca fazendo-se ao mar, nas brumas da madrugada, ou voltando para terra, sob a luz amarela ou avermelhada dos céus vespertinos; nunca tentou representar o mar revolto ou tempestuoso, assim como evitava as grandes embarcações.

Pedro Weingartner, de origem alemã, como claramente o indica o seu nome, entregou-se principalmente à pintura de gênero grego ou romano, à maneira de Alma Tadema, com uma técnica trabalhada e minuciosa, sem possuir, porém, a ciência desse. Deleita-se também na pintura de figuras e vida dos gaúchos, os cowboys do Rio Grande do Sul, seu estado natal.

João Baptista da Costa é o mais notável pintor de paisagens do Brasil e aquele que melhor tem sabido interpretar a luz forte e o colorido do cenário brasileiro. É profundamente verdadeiro no modo pelo qual transporta para a tela os aspectos mais atraentes e reais da natureza.

É realmente um paisagista brasileiro de grande objetividade, sem se tornar entretanto frio, aceitando o cenário natural tal qual ele se lhe apresenta e não o modificando, de acordo com qualquer preconceito. Algumas das suas paisagens, muito simples e um tanto austeras, desprovidas de toda a sorte de convencionalismo, despertam no observador a mesma comoção forte e intensa que produz qualquer aspecto grandioso da natureza, e isto é obtido sem o emprego de processos esforçados, simplesmente pela intenção de representar fielmente o que ele mesmo sentiu diante de tal cenário.

Como quase todos os artistas brasileiros, João Baptista da Costa foi ao Velho Mundo; conquanto, porém, a sua técnica melhorasse, tornando-se mais rica em tons, e adquirisse mais amplidão, o artista conservou o mesmo caráter individual na interpretação dos assuntos de que trata, e as suas telas continuaram a ser inteiramente típicas do país cujos cenários representam.

Naturalmente, não é João Baptista da Costa o único artista brasileiro que fez sua a especialidade da pintura de paisagens. Na segunda década do último século (N.E.: século XIX, portanto), um artista francês chamado Emile Felix Taunay, filho do famoso Nicolas Antoine Taunay, veio para o Rio de Janeiro com seu pai, para, a convite de el-rei d. João VI de Portugal, fundar a Escola de Belas-Artes no Rio. Nicolas Taunay voltou à França alguns anos depois; seu filho Emile, porém, ficou no Rio e tornou-se um excelente artista, vindo mais tarde a ocupar o cargo de diretor da escola de que seu pai fora um dos fundadores.

Felix Taunay deixou grande número de paisagens e pode com razão ser chamado o pai da pintura de paisagem brasileira. Os seus trabalhos denotam certa ousadia ingênua na cópia da natureza, boa perspectiva, colorido sóbrio e um desenho mais ou menos correto.

Agostinho José da Motta pintou grande número de paisagens, algumas das quais devem figurar nas coleções dos palácios principescos da Itália, pois que a falecida imperatriz d. Thereza, esposa do imperador d. Pedro, enviou várias delas aos seus parentes, para aquele país. Os seus trabalhos, pelo menos a maior parte, mostram uma sinceridade perfeita e muita espontaneidade, mas são destituídos de delicadeza de gosto, poesia na distribuição das cores, precisão nos retoques. Em um meio mais propício, talvez Agostinho da Motta viesse a ser um grande artista.

Henrique Nicolau Vinet, nascido em França, onde foi, por algum tempo, discípulo de Corot, veio para o Brasil em 1860 e morreu no Rio em 1876. Tornou-se um apaixonado do cenário brasileiro, cujo colorido característico, principalmente os tons verdes, em breve aprendeu a representar.

George Grimm, artista alemão, que viveu no Rio de 1881 a 1887, possuía grandes qualidades de paisagista, sabia pintar as rochas e os tons verde-escuros da natureza brasileira. Exerceu notável influência no desenvolvimento da pintura de paisagem no Brasil, porque foi o iniciador da escola ao ar livre e o mestre de vários artistas, tais como Antonio Parreiras, Francisco Ribeiro, Castagnetto, D. Garcia y Vasquez, e Caron, que todos, mais tarde, adquiriram nomeada.

Destes, o único que ainda vive é Antonio Parreiras que, nos últimos anos, tem residido em Paris e hoje, por assim dizer, abandonou a paisagem para se dedicar à pintura de figuras e aos quadros históricos. Antes de ir para a Europa revelou grande originalidade na sua maneira de interpretar o cenário brasileiro, principalmente na pintura do interior sombrio das matas e das grandes pedras cobertas de musgo. Hoje, adquiriu já a proficiência dos pintores parisienses, perdendo, entretanto, um pouco da sua individualidade nacional.

Roberto Rowley Mendes, artista muito mais moço, tem um temperamento poético e dá á sua maneira de representar a paisagem uma nota de emoção idealista, um tanto fantasista. Estudou em França e a sua técnica é por certo brilhante e delicada.

Poderíamos mencionar grande número de outros artistas, mas o espaço de que dispomos é limitado demais para uma relação detalhada de nomes. Dos moços, não se pode, entretanto, deixar de mencionar Helios Seelinger, Eugenio Latour, Lucilio de Albuquerque, os irmãos Chambelland, Carlos Oswald e Arthur Timotheo, que prometem tornar-se artistas de distinção.

Helios Seelinger, filho de pai alemão, tem grande talento imaginativo. Estudou em Munique e Paris; na primeira destas cidades, filiou-se à escola simbolista de pintores como Hans Thoma, Max Klinger e Franz Stuck; na segunda, adquiriu uma técnica ampla, nervosa, que de muito lhe tem valido, na execução de temas simbólicos e fantásticos. Atualmente, trabalha com ardor e não será de admirara que venha a tornar-se conhecido mesmo fora do Brasil.

Dos outros moços, todos, após o seu curso na Escola de Belas-Artes do Rio, foram a Paris e Roma, onde trabalharam nos ateliês de artistas eminentes. Têm demonstrado talento e são ambiciosos: portanto, muito se pode esperar deles.

Como é natural, muitos artistas estrangeiros têm vindo ao Brasil, alguns por pouco tempo, outros para aqui fixarem residência. O trabalho destes artistas tem mais ou menos influído no desenvolvimento da arte no Brasil e deve ser aqui mencionado. Nicolas Antoine Taunay, a que já nos referimos, veio para o Rio em 1816, com outros artistas, para fundar a Escola de Belas-Artes, e deixou alguns bons retratos. Jean Baptiste Débret, que veio nessa mesma ocasião para o Rio, pintou também alguns retratos. Claude Barandier e Louis Auguste Moreau, também artistas franceses que viveram no Rio em meados do último século (N.E.: século XIX), deixaram alguns retratos. Auguste Müller foi um artista alemão que se distinguiu como pintor de retratos e pintor histórico. Ferdinand Krumbholz, cujo nome se encontra no Diccionario de Bryan, artista holandês de mérito, viveu no Rio de 1843 a 1855 ou 1856 e pintou vários retratos, em que se afirma o seu desenho correto e bom colorido e expressão. Augusto Off, também alemão, foi um esplêndido gravador e eminente pintor de retratos. Luigi Borgomanerio, muito bom caricaturista e pintor que tem também o seu nome no Diccionario de Bryan, viveu e trabalhou algum tempo no Rio. Ed. De Martino, ex-pintor de marinhas de S. M. Britânica, começou a sua carreira no Rio, onde se casou e deixou alguns dos seus melhores trabalhos.

Atualmente, vivem no Rio os seguintes artistas estrangeiros: primeiro, e proeminente entre todos, Thomas Driendl, bávaro, que por sua longa residência no Brasil pode ser considerado artista nacional. Driendl seria considerado um grande artista em qualquer país da Europa; é um pintor de figuras e de retratos de primeira ordem. É um destes adivinhadores de almas, évocateurs d'âmes, assim chamados pelo grande crítico francês Thoré Burger, e pode ser filiado à escola de Watts e Leubach.

Benno Treidler é também alemão e mestre consumado em paisagem e em aquarela. Carlo De Servi é um jovem artista italiano com grandes qualidades e que se tem distinguido como pintor de figuras. Encerramos aqui as nossas referências à pintura.

Quanto à escultura, pouco se pode dizer. No passado, existiram apenas dois ou três artistas dignos de nota e mesmo agora não são numerosos os nomes daqueles que podem ser mencionados. Valentim da Fonseca e Silva é o primeiro escultor brasileiro digno de ser considerado como tal. Era homem de cor, filho dum nobre português e duma mulata, e nasceu em Minas Gerais. Seu pai levou-o para Portugal assim como sua mãe. Fonseca e Silva foi educado em uma das províncias daquele país, tornando-se um hábil desenhista e gravador em madeira. Depois da morte de seu pai, voltou ao Rio de Janeiro e aqui trabalhou não só como gravador em madeira, mas também como joalheiro em ouro e prata e escultor.

Entre os seus trabalhos principais, podem-se mencionar dois pássaros e um grupo de jacarés executados em duas fontes monumentais do Rio; dois medalhões em bronze no portão principal do Passeio Público do Rio; o teto da igreja da Cruz e da capela mor da igreja de S. Francisco de Paula; o grande número de lâmpadas que ainda existem em várias igrejas do Rio. Valentim da Fonseca e Silva morreu a 1º de março de 1813 e deixou três discípulos, José Carlos Pinto, Simeão José de Nazareth e Francisco de Paula Borges, os quais nada produziram digno de nota.

De 1816 a 1850, seis escultores trabalharam no Brasil, quatro de origem européia e dois nascidos neste país. Auguste Taunay, que veio para o Rio em 1816 juntamente com seu pai, o pintor Nicolas Taunay, e que morreu em 1823, executou apenas algumas estátuas de barro que nunca foram fundidas em bronze e um baixo-relevo em mármore que ornamenta a fachada do velho edifício da Academia de Belas-Artes. Foi professor de escultura nesta Academia e teve como sucessor outro artista francês, Marc Ferrez, que foi o autor da estátua do imperador d. Pedro I e dum busto de d. João VI de Portugal, que se encontra na Biblioteca Nacional do Rio.

Luigi Giudice, escultor italiano, que veio para o Rio em 1850, executou bustos de poetas e escritores brasileiros e um baixo-relevo em pedra de Lisboa que se encontra na Casa de Misericórdia do Rio.

Outro escultor, de nome Patrich, viveu no Rio mais ou menos por essa época e é o autor de algumas estátuas de mármore que se acham na Casa de Misericórdia, na Biblioteca Nacional e no Asilo de Alienados no Rio de Janeiro.

Francisco Manuel Chaves Pinheiro, nascido no Rio de Janeiro a 5 de setembro de 1822 e falecido a 6 de março de 1884, foi um dos discípulos de Marc Ferrez e seu sucessor como professor de escultura da Academia de Belas-Artes. De sangue mestiço, era um homem de forte vontade e um trabalhador enérgico. Não possuía imaginação muito brilhante nem grande educação literária. Adquiriu entretanto uma educação artística regular e deixou alguns trabalhos que tornarão o seu nome lembrado no futuro. Destes trabalhos, os principais são: uma estátua eqüestre do imperador d. Pedro II; duas estátuas do mesmo imperador a pé; a estátua dos atores João Caetano dos Santos e Joaquim Augusto; um grupo em gesso - Colombo descobrindo a América; um São Sebastião, padroeiro do Rio, o qual se acha na Câmara Municipal da cidade; e 12 estátuas em madeira, tamanho natural, representando os 12 apóstolos, as quais se encontram na igreja de São Francisco de Paula. Chaves Pinheiro teve dois discípulos, Almeida Reis e Rodolpho Bernardelli, que completaram os seus estudos na Europa e merecem especial menção.

Candido Caetano de Almeida Reis nasceu no Rio em 1840. Entrou para a Academia das Belas-Artes em 1854 e em 1865 obteve o prêmio de viagem. Em França, estudou com Rochet. Almeida Reis, filiado à escola filosófica de Augusto Comte, era austero tanto na vida social como na vida artística. Era um pensador dotado de imaginação ardente, mas a sua educação técnica, muito acima da média comum, não estava, ainda assim, à altura de suas concepções. Teve também que lutar com a indiferença e a ignorância duma sociedade ainda em formação, incapaz de apreciar convenientemente o seu talento criador. Os seus trabalhos principais são: a estátua de Miguel Angelo, duma execução ampla e vigorosa; Stella d'Alva, figura simbólica, uma bela mulher sobre um hemisfério; a estátua simbólica do Crime; um grupo simbólico do Gênio e da Fome, a estátua de Antonio José o Judeu, poeta brasileiro que foi uma das últimas vítimas da Inquisição em Portugal; e a estátua alegórica do Progresso, que se acha na fachada da estação principal da Estrada de Ferro Central do Brasil, no Rio de Janeiro.

Rodolpho Bernardelli, nascido em 1852 e atualmente diretor da Escola de Belas-Artes do Rio, é um artista moderno no sentido completo da palavra e que faria honra a qualquer país. Em 1870, entrou para a Escola de Belas-Artes; em 1874, executou uma estátua chamada Saudade da tribu e em 1875, outra, À espera, ambas inspirada na vida dos aborígines brasileiros e ambas premiadas na Exposição Universal de Filadélfia. Em 1877 tornou-se pensionista da Escola por concurso e passou nove anos em Roma, trabalhando com assiduidade e diligência nos ateliês dos famosos escultores Monteverde e Maccagnani d'Orsi.

Em Roma, executou o seu primeiro trabalho realmente importante: um grupo em mármore do Christo e a Adultera, com as figuras um pouco maiores que o trabalho natural. A concepção deste grupo é impressionante, bela e moderna. A figura do Cristo, de vigoroso e belo tipo judaico, foi bem estudada e é imponente. Muito humana e real, possui a expressão viril requerida pela cena. De pé, com o corpo coberto pela grosseira túnica de lã, o braço direito erguido em direção à multidão furiosa a quem fala, protege com o braço esquerdo a desgraçada mulher arrependida, ajoelhada a seus pés. Lorde Leighton viu este grupo no ateliê de Bernardelli em Roma e ficou tão impressionado que aconselhou o artista brasileiro a ir se estabelecer em Londres.

Em Roma, travou também Bernardelli relações com outro artista inglês, Alfred Gilbert, que mais tarde encontrou novamente em Chicago; estabeleceu-se entre os dois artistas uma amizade que nem a distância nem o tempo puderam quebrar. Bernardelli não seguiu o conselho de lorde Leighton e voltou ao Brasil. Com a proclamação da República no Brasil, Rodolpho Bernardelli, que já havia sido chamado a ocupar a cadeira de professor de escultura na Escola de Belas-Artes, foi nomeado diretor deste instituto e desde então tem estado à sua frente. Remodelou a escola de acordo com os melhores estabelecimentos deste gênero na Europa. Rodeou-se dos mais prometedores talentos nacionais e d'alguns artistas europeus de grande valor, e se a Escola de Belas-Artes do Rio não forma tantos artistas quanto seria de desejar, não é isso devido a não poder dar a instrução necessária, mas sim à circunstância de não oferecer o meio suficientes garantias de futuro na carreira artística. Só aqueles que sentem fortes, irresistíveis, inclinações para a arte, se aproveitam do ensino que pode dar a Escola.

Foi também principalmente devido a Rodolpho Bernardelli que se construiu um belo edifício situado na principal avenida do Rio de Janeiro, para a Escola de Belas-Artes e a Galeria Nacional de Belas-Artes. Esta última foi também fundada por el-rei d. João VI de Portugal que, em 1808, trouxe de Lisboa as obras que constituíram o seu núcleo inicial. A Galeria Nacional, comparada às grandes galerias européias e a alguns museus de arte norte-americanos, faria figura bem modesta; entretanto, alguns artistas como Velasquez, Van Dick e Ticiano ali estão representados, e é ali que se deve dirigir todo aquele que queira estudar a evolução da arte no Brasil.

A posição oficial de Rodolpho Bernardelli não o impede todavia de produzir, como o provam vários monumentos que ornam as principais praças e vias públicas do Rio e d'outras cidades brasileiras. O Rio de Janeiro não possui ambiente artístico para que um escultor eminente como Bernardelli possa ser perfeitamente apreciado, como merece. É um artista brilhante; a sua habilidade técnica atinge a perfeição; e embora antes um realista, possui espírito criador com tendências pouco vulgares. Como retratista, a sua arte sabe dar vida à semelhança física de seus modelos.

Dos seus discípulos, o mais distinto é José Octavio Corrêa Lima, tanto em talento como em habilidade técnica. Corrêa Lima promete tornar-se rival do seu mestre, a quem sucedeu como professor de escultura da Escola de Belas-Artes. Tem produzido algumas pequenas estátuas de bronze, notáveis pelo vigor com que foram tratadas e pela ousadia da execução. É um artista cheio de idéias e que se sabe interpretar de modo impressionante. É também autor de uma bela estátua, em pé, do almirante Barroso, um dos mais valentes homens de mar que o Brasil tem tido.

Resumindo, deve-se dizer que, conquanto tenha sido cultivada por mais dum século no país ou, antes, exclusivamente na capital, a arte é ainda uma árvore sem raízes profundas e tem vivido principalmente da pequena proteção que lhe dispensa o Governo. A princípio, existiam apenas as pinturas que os jesuítas e as outras ordens religiosas trouxeram para o Brasil, como o haviam feito para as outras colônias. De Portugal, recebeu o Brasil uma influência artística muito superficial, durante o tempo em que esteve sob o seu domínio, e esta mesma foi rapidamente destruída pela influência dos artistas franceses, importados de França pelo rei d. João, para fundar a Academia de Belas-Artes.

Durante, por assim dizer, todo o século XIX, foram os artistas, em geral, buscar a inspiração na Bíblia, na Mitologia e na História antiga, que não pode ser compreendida senão por um pequeno número de intelectuais. Nem o movimento que se caracterizou pela procura dos temas da vida e lendas das várias tribos índias que povoaram o país, nem as novelas relativas às aventuras e descobertas dos primeiros colonizadores e ao povo humilde da cidade e do interior, que eram os caracteres proeminentes da literatura brasileira nos meados do último século, tiveram eco nos trabalhos dos numerosos artistas brasileiros.

Depois da guerra com o Paraguai, artistas tais como Pedro Americo e Victor Meirelles pintaram grandes telas de batalhas, encomendadas e pagas pelas autoridades governamentais. O ramo de pintura de retratos foi naturalmente exercido com freqüência e constituiu o único gênero de arte em que o artista podia ganhar a vida. Durante os últimos anos do século findo (N.E.: XIX), maior número de artistas foram ao Velho Mundo, estudar em centros artísticos, tais como Paris e Roma, e de lá voltaram artistas europeus, não só na educação técnica como também nas fontes de inspiração.

Até agora não têm aparecido indícios da inspiração ou sentimento nacionais, à exceção talvez dos trabalhos de Almeida Junior ou das paisagens de João Baptista da Costa. O que sempre tem faltado para animar e amparar o artista é o reconhecimento do mérito, e a perfeita apreciação por parte do público. O povo brasileiro acha-se ainda na fase de formação e, portanto, é na quase totalidade indiferente a assuntos de arte.

Pode-se dizer que, com muito poucas exceções, existe um grande desinteresse pelas cousas de arte, entre as classes elevadas. Muito poucas são as pessoas que compram quadros ou outras obras de arte; e assim, falta o principal incentivo para a formação duma atmosfera artística real. Torna-se impossível prever a tendência real de quaisquer movimentos artísticos no Brasil, ou, para falar com mais precisão, no Rio de Janeiro, pois que, até aqui, todo o desenvolvimento artístico tem sido quase exclusivamente limitado à capital do país.

Entretanto, os progressos realizados pelo país, nestes últimos anos, têm sido extremamente rápidos e têm mesmo tido um caráter maravilhoso. As cidades principais foram reconstruídas e melhoradas; abriram-se largas magníficas vias públicas; construíram-se belos e vastos parques, majestosos edifícios públicos, lindas residências particulares; e com o aumento persistente e contínuo em riqueza e com as visitas agora mais freqüentes das pessoas abastadas à Europa, o gosto tem sido educado e já existem algumas coleções de arte em via de organização.

Já se fazem exposições de trabalhos dos mais famosos mestres franceses, italianos e espanhóis no Rio de Janeiro e em S. Paulo; e avultado número destes trabalhos têm ficado no país.

A magnitude do movimento artístico no Brasil não pode, pois, desde já ser prevista; mas é permitido esperar que o que se está dando nos Estados Unidos da América do Norte ocorra também na nação irmã do hemisfério Sul e que, num futuro não muito longínquo, o Brasil venha ter artistas notáveis e coleções importantes como aquelas de que se orgulham os Estados Unidos.

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