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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - SANTOS EM 1913 - BIBLIOTECA NM
Impressões do Brazil no Seculo Vinte - [48]

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Clique nesta imagem para ir ao índice da obraAo longo dos séculos, as povoações se transformam, vão se adaptando às novas condições e necessidades de vida, perdem e ganham características, crescem ou ficam estagnadas conforme as mudanças econômicas, políticas, culturais, sociais. Artistas, fotógrafos e pesquisadores captam instantes da vida, que ajudam a entender como ela era então.

Um volume precioso para se avaliar as condições do Brasil às vésperas da Primeira Guerra Mundial é a publicação Impressões do Brazil no Seculo Vinte, editada em 1913 e impressa na Inglaterra por Lloyd's Greater Britain Publishing Company, Ltd., com 1.080 páginas, mantida no Arquivo Histórico de Cubatão/SP. A obra teve como diretor principal Reginald Lloyd, participando os editores ingleses W. Feldwick (Londres) e L. T. Delaney (Rio de Janeiro); o editor brasileiro Joaquim Eulalio e o historiador londrino Arnold Wright. Ricamente ilustrado (embora não identificando os autores das imagens), o trabalho é a seguir reproduzido, em suas páginas 1.008 a 1.013, referentes ao Estado (ortografia atualizada nesta transcrição):

Impressões do Brazil no Seculo Vinte

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Cidade de União da Vitória, junto ao Rio Iguaçu
Foto publicada com o texto, página 1.008. Clique >>aqui<< ou na imagem para ampliá-la

Santa Catarina

pesar de suas dimensões relativamente pequenas, o estado de Santa Catarina dispõe de elementos que lhe garantem um futuro de grande importância.

Em primeiro lugar, deve-se contar com o seu clima magnífico, particularmente propício ao desenvolvimento das raças européias; o recorte de seu litoral, em que avulta, ao Norte, a esplêndida baía de S. Francisco, provável porto militar do Brasil, no futuro, é outro elemento de valor; e finalmente conta Santa Catarina com a circunstância de ser o mais germanizado dos estados brasileiros, não sendo necessário encarecer aqui as grandes virtudes desses colonizadores, tão numerosos já nalguns pontos do território catarinense que eles quase constituem verdadeiras colônias alemãs dentro do estado.

Acresce ainda que, pela sua geral configuração e por sua situação geográfica, o estado de Santa Catarina é um dos mais bem dotados do Brasil.

O antigo litígio, que ainda sustenta com o estado do Paraná, seu vizinho do Norte, impede a determinação positiva dos seus limites, nessa parte. Ao Oeste, confina com a República Argentina; ao Sul, com o Rio Grande do Sul; e a Leste, com o Oceano Atlântico. O seu litoral, com cerca de trezentas milhas de extensão, é, se excetuarmos o Rio de Janeiro, o primeiro em belezas naturais. À pequena distância do continente, existem algumas ilhas pitorescas, das quais as maiores são a de Santa Catarina, que dá seu nome ao estado e é sede da capital, e a de S. Francisco, na extremidade setentrional do estado.

A linha divisória, ao Norte, é o Rio Iguaçu, um dos principais afluentes do Paraná; e ao Sul, o Rio Uruguai, constituindo estes dois belos cursos fluviais um limite natural bem definido. A sua área total é de cerca de 74.156 quilômetros quadrados, segundo a Comissão da Carta Geral, de 1873.

Levantando-se abruptamente a uma grande altura, em linha paralela à costa, a Serra do Mar forma um extenso planalto que, ao Norte, dá origem ao Rio Iguaçu, e ao Sul ao Rio Uruguai. Entre o mar e esta cordilheira, há um estreita faixa de terra, mais ou menos montanhosa e fértil, regada por pequenos rios que descem pelo flanco oriental da aludida serra. Nas mais acentuadas reentrâncias da linha da costa, em S. Francisco e Itajaí, formaram-se magníficos portos; há também esplêndida ancoragem em Florianópolis, para navios de menor calado, no estreito entre a comprida Ilha de Santa Catarina e o continente.

Na costa ocidental desta ilha acha-se situada, como já foi referido, a cidade de Florianópolis, capital do estado, distando do litoral cerca de 5 milhas. Daí, a vista é indescritível, inimaginável Parece descer inesperadamente da cordilheira, ao longe, um contraforte que vem beijar as águas serenas do canal, crivado de inumeráveis embarcações. A atmosfera diáfana faz realçar o efeito da serra longínqua, que se eleva, azul e misteriosa, no límpido firmamento.

A cidade do Rio é deliciosa com a sua beleza fantástica. As suas montanhas se erguem imponentes em um mar de esmeralda, mas a cada passo se entrecortam, deixando em perfeito destaque picos pontiagudos que parecem falar de um cataclismo medonho. O encanto de Santa Catarina, porém, é brando e suave, dando a impressão de uma paz ininterrupta.

As terras altas de Santa Catarina e as de Rio Grande e Paraná hão de ser um dia habitadas por uma grande população, tornando-se a pátria de uma raça vigorosa, mista de latinos e teutônicos. Com São Paulo, esses estados sempre foram tidos como os mais saudáveis, e de mais feliz situação, em todo o Brasil, constituindo os quatro uma região de incalculável futuro.

O clima é delicioso e próprio pra a cultura do trigo e da cevada, artigo estes que terão esplêndido mercado quando se inaugurarem as diversas estradas de ferro em projeto. As chuvas caem durante pouco mais de três meses no ano. Na costa mais baixa do Atlântico, a média da temperatura é mais elevada, quase tropical; mas nos vastos planaltos que gradualmente declinam para o ocidente, são sensíveis as diferenças de inverno e verão.

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Cabeceiras do Rio do Peixe
Foto publicada com o texto, página 1.002. Clique >>aqui<< ou na imagem para ampliá-la

História

Santa Catarina foi visitada pelo espanhol Juan de Solis, em 1515; por Sebastião Cabot, em 1525; e por Diogo Garcia, em 1526. Em 1532, Pedro Lopes de Souza foi enviado por seu irmão Martim Affonso de Souza, a explorar a costa Sul de São Vicente (Santos); entrou pelo Rio da Prata e subiu o Rio Uruguai. Ao voltar, desembarcou em Jurumirim, Ilha de Santa Catarina, que denominou Ilha dos Patos.

Contudo, só em 1650 se fez uma tentativa regular de povoar essa parte da costa, quando ali se estabeleceu, com sua família, o paulista Francisco Dias Velho Monteiro, que deu àquele então solitário lugar o nome de Desterro. Mais tarde, Dias Velho Monteiro foi morto traiçoeiramente por piratas holandeses, e seus filhos, atravessando o canal, fundaram, no continente, uma povoação, que é hoje a cidade de Laguna, ao Sul do litoral do estado.

Mais ou menos nos fins do século XVII, os bandeirantes de S. Paulo, em busca de escravos indígenas, percorreram as altas regiões de Santa Catarina e fundaram um estabelecimento, a que deram o nome de Nossa Senhora dos Prazeres, hoje cidade de Lages, a Sudeste do sertão. Nesse tempo, fazia parte da Capitania de São Paulo, separando-se em 1738 para ficar subordinada à do Rio de Janeiro. O primeiro governador, nomeado em 1739, foi José da Silva Paes.

Em 1762, foi a Ilha de Santa Catarina atacada pelos espanhóis, e novamente por Pedro Cevallos em 1777; e foi restituída a Portugal, pelo tratado de S. Ildefonso, no ano seguinte.

A jurisdição de Santa Catarina foi, pouco a pouco, estendendo-se para o Sul, até compreender uma boa parte do Rio Grande. Esta região, porém, progrediu rapidamente e, em 1760, fez-se capitania geral, a que ficou subordinada Santa Catarina, que assim continuou até à independência do Brasil. Passou então a ser província do Império, tendo-lhe sido anexado o território de Lages, em 1820. E afinal, em 1889, foi reconhecida como um dos estados autônomos da União. Santa Catarina faz-se representar no Congresso Federal, por três senadores e quatro deputados.

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Algumas vistas do estado de Santa Catarina: 1) Cachoeira perto de Florianópolis; 2 e 5) Cascata de Piraí, perto de Joinville; 3) Colônia Faraguá; 4) São Francisco
Foto publicada com o texto, página 1.010. Clique >>aqui<< ou na imagem para ampliá-la

Não houve colonização oficial e vasta desta bela região, enquanto o rei d. João V não mandou famílias açorianas, para se estabelecerem no continente. Daí por diante, a colonização do país progrediu gradativamente, até que em 1849 ao seu desenvolvimento foi dada uma nova fase, com o grande impulso que recebeu do estabelecimento da colônia de Joinville, que ocupa a Nordeste algumas milhas, a partir da baía de São Francisco para o interior.

O duque de Joinville, filho de Luiz Philippe, fundou essa colônia especialmente de alemães, numa superfície de 170.000 quilômetros quadrados, que foram separados do dote de sua esposa, princesa d. Francisca, irmã do imperador d. Pedro II.

Tudo foi favorável ao seu desenvolvimento, naquele tempo, especialmente o êxodo geral, que houve, de alemães, por descontentamentos políticos e convulsões na Europa, e dentro de poucos anos depois da sua inauguração, tornou-se uma das mais prósperas cidades do Sul do Brasil.

É dotada de largas ruas arborizadas, com belas habitações à moda do Reno, algumas importantes, com pitorescos jardins, que emprestam à cidade um ar de poesia e prosperidade.

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Onde os imigrantes estão construindo as suas casas, em Santa Catarina
Foto publicada com o texto, página 1.011. Clique >>aqui<< ou na imagem para ampliá-la

Agricultura, indústria, centros de população

Joinville tem agora uma população de 25.000 habitantes e é a cidade principal de um rico distrito agrícola com manufaturas de alguma importância. Centenas de vagões carregados de erva-mate passam pela cidade em busca do porto de São Francisco para embarque; fumo, trigo, centeio, cevada e laticínios são aí produzidos, e cerca de duzentas fábricas têm sido instaladas, inclusive uma refinação de açúcar no arrabalde Pirabeiraba, um engenho de arroz, cinco estabelecimentos para beneficiar o mate, quatro fábricas de fiação de algodão, algumas fundições, cervejarias instaladas e dirigidas por alemães e outras empresas.

As autoridades municipais dão grande atenção à instrução pública, sustentando a cidade de Joinville cinqüenta escolas com uma freqüência média de 3.000 alunos.

Povo de hábitos frugais, que são o distintivo do agricultor alemão em sua própria pátria, e que os brasileiros descendentes de alemães herdam de seus pais, esses colonos, de índole naturalmente econômica, têm, ao mesmo tempo, adquirido a compreensão da grandeza do país e a hospitalidade que caracteriza o brasileiro; e são também dotados de um espírito de iniciativa e de um temperamento otimista, virtudes estas que, respectivamente, caracterizam as duas raças.

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Núcleo colonial Anitápolis, Santa Catarina: 1) Transporte de imigrantes para as suas novas habitações; 2) Vista de Anitápolis; 3) Estrada de rodagem; 4) A casa do médico
Foto publicada com o texto, página 1.012. Clique >>aqui<< ou na imagem para ampliá-la

O clima salubre e o fertilíssimo solo de Santa Catarina são especialmente adaptáveis à colonização de europeus do Centro e Norte. Cerca de dois anos depois do estabelecimento da colônia de Joinville, fundou o dr. Blumenau outra colônia alemã que tomou o seu nome, tendo para isso escolhido uma grande extensão de terra na região mais fértil do estado, às margens do Rio Itajaí, a Sudoeste de Joinville e a Noroeste de Florianópolis, e distante da primeira cerca de 30 milhas.

Blumenau teve de sustentar, a princípio, uma grande luta e precisou do auxílio do governo geral; mas, depois disso, tomou rápido incremento e é hoje o centro de um distrito de 40.000 habitantes, que, de acordo com as intenções do seu digno fundador, são, em maioria, de origem alemã. Tem, como Joinville, algumas fábricas importantes.

O porto principal de Santa Catarina é o de Itajaí, cidade pitoresca, de 20.000 habitantes, situada na foz do rio do mesmo nome. O dr. Lauro Müller, uma das figuras de maior destaque na política do Brasil, cujo nome logo assinala sua origem alemã, é natural de Itajaí.

Será de grande importância esta cidade, quando, em futuro próximo, se tornar o centro de exportação de manganês, mica etc., recentemente descobertos nas suas vizinhanças. O Rio Itajaí, cuja largura varia de 200 a 500 jardas, entre o mar e Blumenau, é navegável por pequenos navios em cerca de 30 milhas.

As exportações de Blumenau constam de fumo, açúcar, trigo e laticínios. É um das aprazíveis cidades de Santa Catarina, de aparência mais germânica do que brasileira, pela predominância do tipo, da arquitetura e dos costumes teutônicos. Só a produção do fumo representa considerável receita, exportando-se dali cerca de dez milhões de cigarros e charutos para os mercados de Hamburgo e Bremen. Outra fonte de riqueza é a sua indústria de laticínios; exportam-se anualmente cerca de 500 toneladas de manteiga, além de considerável quantidade de queijos, frutas e outros artigos.

Na vizinhança de Blumenau encontram-se granito e mármores de superior qualidade, que aguardam a iniciativa do capitalista. Está em construção uma estrada de ferro que ligará essa cidade a Curitibanos, a 100 milhas para o Oeste, centro florescente que teve origem como ponto de pousada e acampamento das tropas brasileiras, quando iam para as guerras do Sul, ou de lá voltavam. Esta estrada servirá a duas outras colônias alemãs, ao longo do vale do Itajaí, Harmonia e Brusque. É uma linha independente da de São Paulo e RIo Grande do Sul e pertence a capitalistas alemães.

Há também em construção uma estrada de ferro, que atravessará o estado de Santa Catarina, na direção Oeste de Curitibanos, a partir da fronteira do Paraná, em Porto da União, para a fronteira do Rio Grande do Sul, como parte da linha estratégica do Rio de Janeiro ao extremo Sul da República.

Da mesma forma se acha em trabalhos uma linha para o Oeste do estado, indo do porto de São Francisco às famosas Quedas do Iguaçu. Atualmente já se pode ir de S. Francisco a Joinville, por estrada de ferro, o que representa um pequeno passeio de 10 milhas. Em tempo não remoto estará o estado de Santa Catarina vantajosamente cortado de valiosas vias férreas estratégicas e comerciais.

Uma das mais velhas cidades do interior é Lages, centro de ricas pastagens, na parte Sul do planalto que corre o estado de Norte a Sul. Além da criação de gado há o cultivo de frutas e cereais com ótimos resultados. A cultura da vinha promete grandes resultados; e também se colhe o mate nas florestas circunvizinhas de Lages.

Até agora privada de estradas de ferro, a parte Oeste de Santa Catarina acha-se naturalmente muito pouco povoada. Várias tribos indígenas, resto das inúmeras raças que viviam neste bom território, no tempo dos primeiros colonos, têm ainda o seu habitat na parte ocidental do estado.

A ação recente do governo federal, equipando expedições educativas e conciliatórias para civilizar estes e outros grupos de índios por todo o Brasil e ensinar-lhes os processos industriais e agrícolas, provocou em Santa Catarina grandes antipatias especialmente entre o elemento germânico. Os colonos protestaram contra o ato do governo federal, classificando-o de inútil e dizendo que a exterminação é o único remédio possível para a incorrigível selvageria dos índios.

Entretanto, alguma coisa se tem já feito em Santa Catarina, e, à custa de poucas vidas, vários pequenos grupos de selvagens têm sido induzidos a experimentar a agricultura e a fixar residência.

Especial atenção foi recentemente atraída para o Sul do litoral, onde se descobriram ricos depósitos de carvão. A estrada de ferro D. Thereza Christina, especialmente construída para ligar as minas de carvão ao porto de mar do Imbituba, e que passa pela cidade de Tubarão, tem agora um pequeno ramal de Imbituba a Laguna, ao longo da costa, que está sendo prolongado para o Norte até Massiambu; e acha-se em construção um outro, de Tubarão a Araranguá, perto da fronteira do Rio Grande. Todas estas cidades estão situadas numa zona muito fértil.

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Vistas de Joinville
Foto publicada com o texto, página 1.013. Clique >>aqui<< ou na imagem para ampliá-la

Laguna tem a população de 20.000 almas, e está bem colocada, dominando a baía de seu nome ao Oeste e o Atlântico a Leste. Sabe-se que foi a sede de uma população muito antiga; há ali a imensa plataforma de conchas empilhadas perto do mar, conhecida pelo nome de sambaqui, que se supõe ser de formação pré-histórica. Um geólogo alemão, à vista da posição deste sambaqui, afirma que o oceano se afasta da costa brasileira, porque atualmente está a muitos metros acima da maré alta. Ao longo de toda a costa de Santa Catarina se encontram destes sambaquis.

A algumas milhas ao Norte de Massiambu está situada a pequena cidade de São José, enfrentando Florianópolis, capital do estado. S. José, Palhoça, Biguassu, Tijucas e outros pequenos portos estão ligados por um bom serviço de barcas. Nas proximidades de Palhoça acham-se as fontes termais conhecidas por Caldas da Imperatriz.

Como sede do governo, Florianópolis é, decerto, a cidade mais importante do estado; contudo, não tem colhido todos os benefícios de que poderia gozar na sua posição de capital. Os grandes transatlânticos raramente procuram o seu porto, que é, todavia, visitado, duas vezes por semana, pelos vapores do Lloyd Brasileiro e da Navegação Costeira.

A exportação do estado é do valor de 600.000 libras e a importação de 300.000 libras. Quando o estado estiver recortado pelas estradas de ferro em via de construção, rápido e considerável impulso tomará o seu desenvolvimento, com grande vantagem para a operosa colônia alemã.

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