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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - SANTOS EM 1913 - BIBLIOTECA NM
Impressões do Brazil no Seculo Vinte - [59]

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Clique nesta imagem para ir ao índice da obraAo longo dos séculos, as povoações se transformam, vão se adaptando às novas condições e necessidades de vida, perdem e ganham características, crescem ou ficam estagnadas conforme as mudanças econômicas, políticas, culturais, sociais. Artistas, fotógrafos e pesquisadores captam instantes da vida, que ajudam a entender como ela era então.

Um volume precioso para se avaliar as condições do Brasil às vésperas da Primeira Guerra Mundial é a publicação Impressões do Brazil no Seculo Vinte, editada em 1913 e impressa na Inglaterra por Lloyd's Greater Britain Publishing Company, Ltd., com 1.080 páginas, mantida no Arquivo Histórico de Cubatão/SP. A obra teve como diretor principal Reginald Lloyd, participando os editores ingleses W. Feldwick (Londres) e L. T. Delaney (Rio de Janeiro); o editor brasileiro Joaquim Eulalio e o historiador londrino Arnold Wright. Ricamente ilustrado (embora não identificando os autores das imagens), o trabalho é a seguir reproduzido, em sua página 1.069, referente ao Estado (ortografia atualizada nesta transcrição):

Impressões do Brazil no Seculo Vinte

Território do Acre

ituado no coração da América do Sul, no extremo Oeste do Brasil, entre as longitudes 65º e 74º Oeste de Greenwich e as latitudes 6º e 12º Sul do Equador, tem o território do Acre muito aproximadamente a forma de um triângulo e é limitado ao Norte e a Leste pelo estado do Amazonas; ao Sul, pela Bolívia; e a Oeste, pelo Peru.

Esta vasta zona cujo solo é desprovido de acidentes de importância, ocupa as bacias do Alto Juruá, Alto Purus e Alto Acre, rios estes que, como todos os da Amazônia, apresentam variação extrema em seu volume de águas, entre a estação de seca e a estação das chuvas.

O território do Acre tem uma superfície de cerca de 191.000 quilômetros quadrados (segundo o cálculo feito pelo almirante Guilhobel) e é literalmente retalhado por afluentes e subafluentes dos três rios mencionados. Quase todas essas correntes se dirigem de Sudoeste para Noroeste.

O Acre, mal conhecido e despovoado há 30 anos, era reclamado, no todo ou em parte, pelo Brasil, Bolívia e Peru, até que o Brasil, por uma nota de seu Ministério das Relações Exteriores, reconheceu naquela zona a soberania da Bolívia.

A população do Acre, constituída por brasileiros e principalmente por cearenses, não se mostrou, porém, disposta a se submeter ao governo boliviano. De todos os lados rebentaram sublevações parciais e, finalmente, a revolução, geral em todo o território dos seringueiros acreanos, bateu as forças da Bolívia e forçou à retirada dos contingentes, que, na zona, mantinha aquele país.

Foi então proclamada a autonomia do Acre e organizado um governo provisório, sob a chefia de Placido de Castro. Expedições bolivianas pretenderam readquirir o território do Acre; mas, em encontros sucessivos, foram repelidas ou reduzidas à impotência e cercadas pelos acreanos, dentro dos campos fortificados.

Com a rendição de Porto Alonso, onde se achava a principal força boliviana, entregue aos revolucionários do Acre depois de um cerco de alguns meses, ficou bem patente a impossibilidade de manter a Bolívia o seu domínio naquelas paragens longínquas, habitadas por uma população que, brasileira, queria a anexação ao Brasil.

O tratado de Petrópolis, de 1903, veio pôr termo à anarquia naquela zona, de uma riqueza extraordinária. Pelo tratado referido, cedia a Bolívia ao Brasil o Território do Acre, recebendo em troca pequenas compensações territoriais na fronteira com o estado de Mato Grosso e uma indenização de £2.000.000, obrigando-se também o Brasil a construir a estrada de ferro Madeira-Mamoré que, contornando as cachoeiras de Sto. Antonio no Madeira, iria dar saída fácil aos produtos de uma vasta zona da Bolívia.

Incorporado ao território nacional, ficou o Acre dividido em três prefeituras: Alto Acre, Alto Purus e Alto Juruá, administradas por prefeitos de nomeação do governo federal.

O clima do Acre, conquanto quente e úmido, tem sido caluniado, considerando-se as suas condições impróprias para o brasileiro do Sul ou para o europeu; a verdade, porém, é que, para qualquer deles, observadas as condições de higiene e cuidados de alimentação, até agora tão descurados, se torna possível e até fácil a aclimatação.

Dos produtos nativos do solo, que são os mesmos do estado do Amazonas, a borracha é, por assim dizer, o único explorado; basta, porém, esse para tornar o Acre uma das zonas mais ricas do país e daquelas a que se deve prever o maior futuro. Os seringais e cauchais do Acre produzem os melhores tipos de sernambi e caucho do mercado.

A população do Acre pode atualmente ser calculada em cerca de 80.000 habitantes, distribuídos pelas sedes dos departamentos, pelas vilas e pelos seringais. É, em sua maioria, composta de cearenses e ressente-se de certa falta de estabilidade, o que acontece sempre nas zonas novamente abertas à civilização, onde a primeira população é constituída por emigrantes.

Dos seus centros de população, ocupa o primeiro lugar Sena Madureira, fundada há apenas 5 anos e elevada à categoria de cidade em 1º de julho de 1907. Sede do Departamento do Alto Purus, fica situada à margem esquerda do Rio Yaco, a 135 metros de altitude. Sena Madureira conta dez ruas, um bulevar e três praças; e brevemente será iluminada à luz elétrica. A sua população é de cerca de 3.500 habitantes, divididos por perto de 500 casas. Existem na cidade uma serraria a vapor, uma olaria também a vapor, duas tipografias, uma farmácia, dois hotéis, um mercado, uma fábrica de cigarros, grande número de estabelecimentos comerciais.

Outras localidades importantes são: Cruzeiro, com cerca de 3.000 habitantes, iluminada à luz elétrica, com ruas bem calçadas, e situada à margem direita do Rio Juruá, sede do Departamento do Alto Juruá; e Rio Branco, sede do Departamento do Alto Acre, situada à margem do Rio Acre. Entre outros centros de população mais ou menos consideráveis, devem-se citar Porto Acre, Barcelona e Goiana.

A instrução pública vai também tomando no Acre um desenvolvimento prometedor. Em Sena Madureira, funcionam quatro escolas públicas; no Departamento do Alto Purus o número desses estabelecimentos de ensino sobe a 21. Na cidade do Cruzeiro, há o Liceu Affonso Penna, estabelecimento de instrução secundária, com programa idêntico ao do Ginásio Nacional e a ele equiparado; ainda no Cruzeiro, funciona uma escola técnica de artes e ofícios.

No Acre, cortado de rios numerosos, as vias de comunicação mais usadas são naturalmente os cursos d'água, à margem dos quais ficam os seringais e povoações. A canoa é a verdadeira montaria do acreano, que dela se serve com a mesma utilidade com que o fazendeiro no Sul emprega o seu animal de sela.

Pelos rios mais importantes, que correm para o Amazonas, é também o território do Acre ligado a Manaus e daí ao resto do Brasil.  via fluvial, a única que até hoje existe, não pode, porém, ser utilizada no tempo da seca, senão por embarcações de um calado diminuto; assim, nesta estação, fica o Acre privado de comunicações regulares.

O governo federal pensa em remediar esse inconveniente, grande para o desenvolvimento do Acre, quer desobstruindo os rios, quer construindo estradas, que ponham a coberto de tal emergência.

Como vias de comunicação terrestre ao interior do território, existem atualmente apenas duas estradas: uma que liga Sena Madureira a Cruzeiro e outra que liga Rio Branco a Sena Madureira.

A despeito das dificuldades e demora das comunicações, o comércio do Acre, graças à borracha, é importante; e tal importância fica bem patente pela renda federal do imposto de exportação daquele artigo. Nos últimos anos foi ela de Rs. 570:502$529 em 1903; Rs. 2.376:932$377 em 1904; Rs. 8.700:959$140 em 1905; Rs. 9.173:953$916 em 1906; Rs. 13.666:832$257 em 1907; Rs. 9.474:369$753 em 1908; Rs. 14.062:193$849 em 1909; Rs. 19.866:541$388 em 1910.

Atualmente, os gêneros para o consumo são importados por intermédio da praça de Manaus, cujas casas aviadoras mantêm relações comerciais não só com os estabelecimentos e casas de negócio das cidades do Acre, mas também diretamente com os seringais, onde tudo chega por um preço elevadíssimo.

No Acre, a verdadeira moeda corrente é a borracha. A troco de borracha, faz o seringueiro o suprimento do seu barracão, com os artigos que de Manaus lhe envia o aviador; a troco de borracha trazida ao barracão, faz o operário seringueiro o seu fornecimento antes de se embrenhar no seringal, à colheita da preciosa hevea; ainda a troco de borracha, vem o índio manso buscar ao barracão as provisões de que precisa.

O Acre, pela sua riqueza florestal imensa, pela uberdade do seu solo, pela sua enorme produção de borracha, superior à de qualquer dos dois outros estados produtores, Pará e Amazonas, deverá em breve, isto é, uma vez estabelecidas as indispensáveis facilidades de comunicação, tornar-se uma das regiões mais prósperas do país.

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